O governo federal
contestou nesta quinta-feira (1º), em uma entrevista coletiva em Brasília, os
dados sobre desmatamento apontados por imagens de satélite usadas no
monitoramento ambiental pelo Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão vinculado ao Ministério de
Ciência e Tecnologia.
Segundo dados do sistema que capta essas imagens de monitoramento
ambiental, o Deter, houve, até o dia 26 de julho, crescimento de 212% nas áreas
desmatadas da Amazônia em relação ao mesmo mês do ano passado.
Ainda de acordo com o sistema gerenciado pelo Inpe, a devastação de
florestas neste período corresponde a 1.864 quilômetros quadrados, área maior
do que o município de São Paulo.
O desmatamento, conforme dados do Deter, já tinha crescido 88% no mês de
junho, na comparação com o mesmo mês de 2018
Na entrevista desta quinta-feira – que também contou com a presença do
presidente Jair Bolsonaro –, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional
(GSI), Augusto Heleno, afirmou que mesmo que o governo considerasse os dados
corretos, seria "conveniente" tratar as informações
"internamente" para não alardear.
“O que preocupa mais aqueles que têm sentimento de brasilidade, que têm
um amor pelo país, como todos deveriam ter, é que esses dados prejudicam muito
a imagem do Brasil. Se fossem dados corretos, era preocupante e seria
conveniente que nós não alardeássemos isso e que nós cuidássemos do problema
internamente, procurássemos corrigir o que está errado", declarou Heleno
durante a entrevista coletiva.
"Sendo dados falsos, é muito grave, porque isso prejudica o
comércio brasileiro, prejudica a imagem do Brasil, nos coloca como grande
destruir do meio ambiente na humanidade. São imagens que depois ficam muito
difícil de resgatar. Isso é o que nos aflige, é a falta de honestidade
intelectual", complementou o ministro do GSI.
Antes de Heleno dar a declaração, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo
Salles, havia feito uma apresentação na qual afirmou que parte do desmatamento
divulgado em junho deste ano ocorreu em meses anteriores, inclusive, em 2018.
"Salto de 88% [de desmatamento em junho de 2019] não é
verdade", reclamou o ministro do Meio Ambiente.
Ao se manifestar em meio à entrevista, Bolsonaro declarou que notícias
sobre aumento de desmatamento – que ele disse não condizer "com a
verdade" – prejudicam a imagem do Brasil no exterior. Ele afirmou que há
"gente" dentro do Inpe interessada em denegrir a imagem do país.
"Não quero afirmar, mas uma notícia como essa [crescimento do
desmatamento na Amazônia], que não condiz com a verdade, tem um estrago muito
grande na imagem do Brasil. Parece que tem gente interessada nisso, que não é a
imprensa, porque o dado saiu lá de dentro [do Inpe], dos órgãos nossos",
acusou Bolsonaro.
Ele, inclusive, defendeu uma apuração para identificar se os
responsáveis pela divulgação dos dados sobre desmatamento do Inpe, contestados
pelo governo, tornaram as informações públicas com objetivo de "desgastar
a imagem do Brasil".
"Acho até que, aprofundando os estudos, ver se as pessoas
divulgaram de má-fé esses informes para prejudicar o governo atual e desgastar
a imagem do Brasil", complementou o presidente da República.
Novo sistema de monitoramento
Após contestar nesta quinta-feira, com o auxílio de um Power Point, os
dados sobre desmatamento divulgados nos últimos dois meses, Ricardo Salles
disse que os questionamentos de integrantes do governo às informações do Deter
não fragiliza a imagem do Inpe.
O ministro anunciou que o governo abrirá uma licitação, junto ao Ibama,
para contratar um novo sistema de monitoramento ambiental que ofereça imagens
de alta resolução para detalhar áreas desmatadas.
"Queremos manter o sistema do Deter, ajudando a equipe, ajudando o
Inpe para que tenha melhores serviços. Uma forma de ajudarmos é complementar as
informações do sistema do Deter também com outras imagens de alta resolução que
fornecessem o detalhamento dos polígonos de um dia para o outro", observou
Salles.
Questionado por repórteres sobre qual seria então o percentual de
desmatamento registrado em junho – na medida em que o governo contesta os
números do Deter – Ricardo Salles disse que não há preocupação para "criar
número". Ele ressaltou ainda que, sempre que necessário, o governo fará
"rechecagem" nos dados.
"A nossa
preocupação não é trabalhar para criar número, seja número qual for. É dizer
que o número, da forma como foi apresentado, e a análise que foi feita, não
estava correta."
O ministro do Meio Ambiente informou que não haverá mudança na
periodicidade da divulgação dos dados do desmatamento. "É preciso analisar
as informações com responsabilidade, e não manipular datas, recortes, para
criar um percentual sensacionalista", criticou o titular do Meio Ambiente.
Ao final da entrevista coletiva, questionado por jornalistas sobre se,
de fato, o desmatamento está aumentando durante o governo dele, Bolsonaro
admitiu que há crescimento da devastação ambiental.
"Na minha opinião,
parece que está aumentando, mas não desta forma como foi divulgado",
respondeu o presidente.
Dados do Deter
Embora tenha colocado sob suspeita os dados gerados pelo Deter para
monitoramento da devastação ambiental na Amazônia, o ministro do Meio Ambiente
assegurou na entrevista que o governo manterá o uso das informações do sistema
para "orientar" o trabalho de fiscalização de órgãos de preservação
ambiental, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama).
As novas contestações do governo em relação às estatísticas de
desmatamento ocorreram quase duas semanas após o início das críticas de Jair
Bolsonaro aos dados do Inpe.
Na última quarta (31), o presidente já havia afirmado, em uma agenda em
Goiás, que "dados imprecisos atrapalham nossos negócios fora do
Brasil", referindo-se a estatísticas de desmatamento divulgadas pelo Inpe.
A polêmica envolvendo o instituto se iniciou em 19 de julho, quando o
presidente da República questionou a precisão dos dados sobre desmatamento ao
ser questionado sobre o assunto por jornalistas de veículos estrangeiros.
Na ocasião, Bolsonaro levantou suspeita de que o diretor do Inpe Ricardo
Magnus Osório Galvão estaria "a serviço de alguma ONG". No dia
seguinte, o dirigente negou as acusações do presidente e reafirmou a veracidade
dos dados sobre desmatamento divulgados pelo Inpe.
Desmatamento
No início de julho, o Inpe informou que o desmatamento na Amazônia Legal
atingiu 920,4 km² em junho, o que corresponde a um aumento de 88% em comparação
com o mesmo mês de 2018. Segundo estatísticas do instituto, junho deste ano foi
o pior mês na questão do desmatamento desde que o sistema de monitoramento de
alertas foi criado, em 2015.
Os dados sobre o desmatamento divulgados pelo Inpe são públicos e podem
ser acessados por qualquer pessoa pela internet. O instituto usa três sistemas
para monitorar o desmatamento:
-o Detecção de Desmatamento em Tempo
Real (Deter) é usado para verificar a derrubada de árvores em tempo real. Ele
dá alertas que apoiam ações do Ibama, o responsável fiscalização das florestas
-o Programa de Monitoramento da
Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes) levanta taxas anuais de
desmatamento
-o TerraClass, que mapeia o uso da
terra após o desmatamento a cada dois anos, em parceria com a Embrapa
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