Foto: Pedro Ladeira/Folhapress
A Polícia Federal concluiu que não houve crime de
prevaricação do presidente Jair Bolsonaro (PL) no caso da compra da vacina
indiana Covaxin. O relatório da investigação foi enviado à ministra Rosa Weber,
relatora do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira (31).
Segundo a corporação, não ficou demonstrada de forma material
a ocorrência de conduta criminosa. A PF ainda informou à magistrada que avaliou
desnecessário interrogar Bolsonaro no caso.
O documento da Polícia Federal, de 52 páginas, foi assinado
pelo delegado William Tito Schuman Marinho. O policial atua no setor
encarregado de inquéritos nos tribunais superiores.
Marinho afirmou que, "ausente o dever funcional do
presidente da República Jair Messias Bolsonaro de comunicar eventuais
irregularidades de que tenha tido conhecimento -e das quais não faça parte como
coautor ou partícipe- aos órgãos de investigação, como a Polícia Federal, ou de
fiscalização, não está presente o ato de ofício" que poderia caracterizar
o crime.
De acordo com o policial, "juridicamente, não é dever
funcional (leia-se: legal), decorrente de regra de competência do cargo, a
prática de ato de ofício de comunicação de irregularidades pelo presidente da
República".
Assim, concluiu o delegado, ainda que o presidente não tenha
agido, não se pode ser imputado o crime de prevaricação no contexto dos fatos
analisados no inquérito.
O que é a prevaricação?
A prevaricação ocorre quando o agente público retarda ou
deixa de praticar ato de ofício para satisfazer interesse próprio. A apuração
foi instaurada em julho do ano passado a pedido da Procuradoria-Geral da
República (PGR), após pressão de Rosa Weber.
Inicialmente a PGR havia pedido para aguardar o fim da CPI da
Covid para se manifestar sobre a necessidade ou não de investigar a atuação do
chefe do Executivo.
No final de junho, três senadores apresentaram no STF uma
notícia-crime contra Bolsonaro por prevaricação. Em seguida, após pressão de
Rosa Weber, a PGR pediu ao STF a abertura de inquérito para apurar o suposto
crime. O Supremo deu aval, e em seguida a PF abriu a investigação a pedido da
procuradoria.
No caso da compra da vacina indiana, senadores consideram que
o interesse de Bolsonaro pode ter sido proteger aliados, como o líder do
governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Em notícia-crime apresentada, os
senadores afirmaram que a suposta omissão do presidente ocorreu "ou por
envolvimento próprio no esquema criminoso ou por necessidade de blingagem dos
amigos do rei".
A prevaricação é um crime contra a administração pública que
acontece quando o agente público deixa de agir da maneira que se espera dele e
no qual é obtida alguma espécie de favorecimento. Exemplos são casos de
policiais ou fiscais que não tomam providência diante de uma irregularidade, para
proteger determinada pessoa.
O Código Penal especifica da seguinte maneira: "Retardar
ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra
expressa disposição de lei, para satisfazer interesse ou sentimento
pessoal".
O ato de ofício é aquele que se espera que o servidor faça
independentemente de um pedido. Governantes, como o presidente da República,
também são funcionários públicos.
A legislação estabelece pena de detenção de três meses a um
ano, além de multa. Por ser de menor potencial ofensivo, o caso tramita nos
Juizados Especiais Criminais, conforme lei de 1995. Essa unidade do Judiciário
objetiva não aplicar penas privativas de liberdade.
Em 2007, houve um acréscimo no Código Penal especificando a
omissão relacionada à entrada de celulares em presídios como crime de
prevaricação de agente público. A pena é a mesma do delito convencional.
Nas altas esferas de governo, embora o crime já tenha sido
debatido em outras crises políticas, a condenação não é tão comum. Um exemplo
recente de condenação por prevaricação foi a aplicada em 2019 pelo Superior
Tribunal de Justiça (STJ) a Cícero Amélio da Silva, ex-presidente do Tribunal
de Contas de Alagoas.
A corte considerou que ele favoreceu um prefeito ao reter os
autos de um processo em seu gabinete antes de uma eleição. Mas essa ação ainda
tem recursos pendentes. Em tese, o delito de prevaricação poderia ser
enquadrado como um crime de responsabilidade do presidente da República.
A chamada Lei do Impeachment, de 1950, usada nos processos de
afastamento contra Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016), inclui
expressões de sentido amplo, como "proceder de modo incompatível com a
dignidade, a honra e o decoro do cargo". Embora também chamados de
"crime", os de responsabilidade não são um tipo penal, mas uma
infração político-administrativa.
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