O acordo de livre
comércio entre países do Mercado Comum do Sul (Mercosul)
e Canadá pode alavancar as exportações agropecuárias em US$ 7,8 bilhões em
2020. A projeção é de um estudo realizado pela
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), divulgado na
última quarta-feira (29), que apresenta os desafios e as oportunidades
para as cadeias produtivas do setor agropecuário.
O Mercosul tem hoje
como membros efetivos Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela (essa
temporariamente suspensa, por motivos de ruptura da ordem democrática). No ano
passado, o comércio entre o Mercosul e o Canadá movimentou cerca de US$ 6,6
bilhões. “Desse total, 85% foi comércio com o Brasil. Isso mostra a relevância
do nosso país nesse bloco, especialmente na relação com o Canadá”, avalia a
coordenadora de Inteligência Comercial da CNA, Sueme Mori.
Com um recorte
específico para o agronegócio, Sueme arrisca dizer que o desempenho brasileiro
diretamente com o Canadá movimentou em torno de US$ 483 milhões no ano passado.
“Esse número já foi muito maior em anos anteriores. O estudo da CNA mostra que
a assinatura de um livre comércio entre o Mercosul e o Canadá tem um potencial
de gerar ganhos de exportações para o agro na casa dos US$ 7,8 bilhões. Ou
seja, o setor acredita que a assinatura desse acordo seria muito benéfica para
as exportações agropecuárias”, reforça a coordenadora.
O levantamento da
Confederação aponta que, em 2019, o comércio direto de bens entre Brasil e
Canadá movimentou cerca de US$ 5,6 bilhões. O país norte-americano foi o nono
principal destino das exportações totais do Brasil, como revelam os dados.
Nesse mesmo ano, as exportações brasileiras tiveram a maior receita desde 1997,
em torno de US$ 3,4 bilhões, e houve registro do maior saldo positivo para o
Brasil no comércio bilateral (USS 1,1 bilhão).
A
coordenadora-geral de Negociações Comerciais Extrarregionais do Ministério das
Relações Exteriores (MRE), Paula Barboza, explica que o Brasil vem estreitando
laços com os canadenses desde 2017, quando “reativou” o contato com país do
Hemisfério Norte. Segundo ela, o país estava em diálogo exploratório com os
canadenses ainda em 2015, mas devido às mudanças no governo do Canadá, o
contato foi reduzido.
“Desde 2016 estamos
em uma política de comércio exterior bastante voltado à abertura e à negociação
de acordos bilaterais. De 2018 para cá, já tivemos sete rodadas negociadoras
com o Canadá, a última delas no segundo semestre de 2019. Esse é um acordo
bastante amplo, que vai envolver liberalização dos mercados de bens, serviços,
investimentos e compras governamentais, além de uma gama ampla de disciplinas.
Ele vai além do acordo que já fechamos com a Associação Europeia de Comércio
Livre (Efta) pela amplitude de comércio”, contextualiza Paula.
Importação e exportação
De acordo com o
estudo “Acordo Mercosul – Canadá: Oportunidades e Desafios para a Agropecuária
Brasileira”, da CNA, os embarques brasileiros de alumina calcinada e outros
produtos químicos, ferro, aço e ouro ajudaram a elevar a receita das
exportações brasileiras em cerca de 45% de 1997 para cá. A alumina
calcinada (óxido de alumínio) e o alumínio representaram cerca de 35% da pauta
exportadora para o Canadá em 2019 – ambos com destino à indústria
automobilística.
Em relação às
importações brasileiras, o principal produto é o cloreto de potássio, utilizado
como fertilizante. O insumo químico, importante para o agro, representou 49,5%
das importações brasileiras do país no ano passado.
Paula Barboza
reforça que essa é a primeira vez que há uma lista negativa negociada pelo
Mercosul na área de serviços e investimentos. Lista negativa quer dizer que
tudo que não estiver na lista está liberalizado. “Então é uma ampla abertura do
setor de serviços e investimentos e no setor de compras. A nossa intenção é
participar de licitações no governo do Canadá, não só na esfera federal, mas
nas províncias também, e isso pode envolver a compra de insumos agrícolas”,
adianta.
A tarifa média de
importação do Canadá é de 4% e cai para 2% no setor industrial. No setor
agrícola, essa média sobe para 15%, com picos que podem ultrapassar os 200%,
segundo análise de Paula. “Hoje, 70% das exportações brasileiras para o Canadá
já entram livre de tarifas. Nosso objetivo é que consigamos entrar no Canadá
com mais de 96% das nossas exportações livres de tarifas”, antecipa.
Para a
coordenadora-geral de Negociações Comerciais Extrarregionais do MRE, o que pode
tornar a relação mais “sensível” entre os países na área agrícola é o sistema
de administração de oferta canadense de alguns produtos, como frangos, ovos e
lácteos. O comércio de produtos do agronegócio com o Canadá registrou, em 2019,
uma movimentação da ordem de US$ 628,7 milhões, valor 25% menor em relação ao
ano anterior, aponta o levantamento da CNA. As maiores baixas registradas foram
as de açúcar de cana, carne bovina industrializada e celulose.
“A sensibilidade do
Canadá é muito grande nesses produtos e em outros, como carne bovina e açúcar,
e eles tendem a ser defensivos em relação a esses produtos. Isso será um
desafio para a equipe brasileira, porque essa sensibilidade envolve produtos
que são carro-chefe do Brasil. Nossas atenções estão voltadas para isso e para
as concessões que o Canadá poderá fazer em relação aos produtos”, alega Paula.
Mercado de carne
O estudo da CNA
aponta um ganho potencial de comércio de carnes, um dos setores sensíveis
apontados pelo MRE. O setor está entre os cinco que concentraram quase 90% das
exportações ao Canadá, ao lado do complexo sucroalcooleiro, café, produtos
florestais e frutas. Os embarques de proteína animal corresponderam a 9,6% do total.
Os números mostram que o valor se divide basicamente em carne de frango in
natura (US$ 36,8 milhões) e carne bovina industrializada (US$ 9,2 milhões).
“A gente deve
observar que o setor de carnes é um setor que geralmente tem um grau maior de
sensibilidade com todos os parceiros com quem negociamos. Com o Canadá, não é
diferente”, observa o coordenador-geral de Assuntos Comerciais do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Carlos Halfeld.
Ele afirma que essa
sensibilidade pode ser maior com a carne de frango. “A carne bovina não
enfrenta picos tarifários tão elevados no Canadá, que fica em torno de 26%. A
carne de frango que é um caso de maior proteção no país da América do Norte,
que enfrenta picos de quase 250%. De fato, são produtos que o Canadá tem maior
resistência a apresentar uma oferta”, alerta.
Na visão de
Halfeld, esses produtos são prioritários no foco de negociação brasileiro. “Com
a abertura obtida pelo acordo, esses setores vão conseguir, de fato, apresentar
um excelente resultado futuro e o Canadá passará a ser um parceiro importante
no destino das nossas exportações de carne”, aposta.
Na avaliação do
diretor do Departamento de Temas Técnicos, Sanitários e Fitossanitários do
Mapa, Leandro Feijó, toda a trajetória de negociações com o Canadá, tanto
dentro do governo federal quanto do setor privado, estabeleceu uma boa linha de
trabalho e de entendimento entre os países. Sobre o mercado de carnes, ele
enfatiza.
“Eu vejo hoje na
cesta de produtos do agro que, sem dúvidas nenhuma, é a cereja do bolo desse
processo, uma vez que já temos o comércio fluido em relação à carne de aves.
Nesse momento nos encontramos em discussão bem aprofundada e acelerada com o
governo canadense para concluir as negociações para abertura do mercado de
carne bovina in natura e da carne suína”, revela Feijó, que conclui: “O setor
traz elementos para que o negociador saiba quais são as necessidades do
produtor brasileiro”.
Inicialmente
previsto para este ano, a expectativa é de que o acordo seja finalizado no
final de 2021 ou em 2022, devido à pandemia do novo coronavírus.
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