A legislação brasileira define que medicamento é todo produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico; sendo um conjunto de substâncias elaboradas que auxiliam na cura de doenças ou ferimentos.
E para que esse produto possa ser comercializado no Brasil, primeiro é necessário passar por uma série de avaliações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Como esse processo pode levar algum tempo ou o valor do medicamento
pode não ser muito atrativo, esses fatores podem gerar dois problemas: o
contrabando e a falsificação.
Um exemplo desta situação, foi a apreensão realizada pela Polícia
Rodoviária Federal no estado de Goiás, na última quarta-feira (27/5). Os
agentes encontraram mais de três mil comprimidos de hidroxicloroquina contrabandeados
do Paraguai para o Brasil. A carga estava escondida em uma caminhonete abordada
próximo à Uruaçu, no norte do estado. “Esse é um trabalho permanente em que as
abordagens têm atenção especial no narcotráfico e contrabando de produtos
ilegais”, explica o inspetor Newton Morais Souza, que é chefe do Setor de
Comunicação Social da PRF em Goiás.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal, a carga ilícita foi descoberta por
acaso, durante uma abordagem de rotina em que os policiais pararam a
caminhonete. “Pelo estado de Goiás estar no coração do Brasil, com diversas
rodovias que cortam o estado e levam para todas as partes do país. Então, é
comum realizarmos esse trabalho de fiscalização”, relata o inspetor da
PRF.
Mas essa apreensão demonstra que o combate ao tráfico não é o único
problema a ser enfrentado. Existe ainda a questão da saúde pública, uma vez que
o contrabando pode colocar em circulação remédios falsificados.
O médico infectologista José David, diretor Científico da Sociedade de
Infectologia do Distrito Federal, aponta o problema no consumo de medicamentos
falsificados no Brasil. “Ou estão adulterados com componentes que, na maioria
das vezes, são tóxicos ou simplesmente não têm o princípio ativo na sua
formulação”.
Como consequência, segundo o médico, a pessoa pode ter o “avanço da doença
uma vez que, na verdade, ela não está usando medicação alguma”, destaca. “O
pior desse processo é que muitas vezes a pessoa está tomando uma medicação para
um problema que ela acha que tem. Isso pode levar a consequências leves ou até
casos mais graves e mesmo a morte do paciente”, diz o infectologista.
Além disso, a hidroxicloroquina e a cloroquina foram enquadrados pela
Anvisa como medicamentos de controle especial, para evitar que pessoas que não
precisam desses medicamentos provoquem um desabastecimento no mercado. E nisso,
chegamos a uma prática comum no Brasil da automedicação, ou seja, consumir
medicamentos sem a devida orientação de um profissional de saúde. Muitas vezes
uma doença pode ter sintomas parecidos a de outra enfermidade e, por isso,
tomar remédios sem a correta orientação pode agravar o estado de saúde ou
esconder sinais importantes para combater a real doença.
Contrabando e
falsificações em tempos de Covid-19
No atual momento em que o mundo enfrenta o novo coronavírus, cada
possibilidade de cura ou tratamento são vistos com grande esperança para o fim
da pandemia. Apesar disso, é preciso atenção para evitar que outros problemas
comecem a surgir como, por exemplo, o frenesi decorrente da hidroxicloroquina
como tratamento à Covid-19. Mesmo sem ainda possuir uma eficácia comprovada
para combater a doença, o Governo Federal liberou a prescrição médica e o uso.
Com isso, a compra desse medicamento aumentou 67% de janeiro a março deste ano,
em comparação ao mesmo período de 2019, segundo dados do Conselho Federal de
Farmácia.
Amanda Gonzaga tem 28 anos e há cerca de quatro anos foi diagnosticada com
Lúpus Discoide, uma doença inflamatória autoimune, que pode afetar múltiplos
órgãos e tecidos, como pele, articulações, rins e cérebro, e que em casos mais
graves, se não tratada adequadamente, pode matar. Uma das formas de tratamento
está baseada no medicamento hidroxicloroquina, que a jovem sempre conseguiu
comprar sem dificuldades. Mas agora não está mais sendo “tão fácil” assim. “Não
consigo encontrar mais aqui, nas farmácias perto de casa. A última vez em que
precisei ir a uma farmácia procurar o medicamento, cheguei a percorrer 25 km, porque
a procura está tão grande que não se acha mais”, lamenta Gonzaga.
Para a presidente da Associação de Lúpus e Outras Doenças Reumáticas do
Vale dos Sinos, Izabel Teresinha de Souza, a situação é “preocupante” e levanta
a questão de necessidade de elaborar formas de proteção aos pacientes que
precisam dessa medicação. “Precisamos de mais informações sobre essa entrada de
medicamentos ilegais no Brasil, pois se o paciente receber um medicamento que
não tem nenhum controle da Anvisa, é um risco à vida”, alerta a médica.
“São várias especialidades médicas que me acompanham para que eu possa
tomar essa medicação. Então, me assusta estar em uma época na qual muitas
pessoas estão estocando essa medicação em casa, sem necessidade e sem
prescrição médica, enquanto existe quem precisa desse remédio para sobreviver”,
ressalta Amanda.
Apesar da apreensão realizada pela Polícia Rodoviária Federal, essa é a
primeira ocorrência relacionada a esse tipo de medicamento. “Não é incomum ter
apreensão de outros tipos de produtos sem regulamentação no Brasil, a maior
parte vem dos países vizinhos, que fazem fronteira com a gente”, explica o
inspetor Newton Morais Souza. “É mais comum encontrarmos contrabando como
cigarros, drogas e, principalmente, produtos oriundos do Paraguai. Em relação a
medicamentos, as maiores ocorrências que nós temos são de produtos veterinários
e de anabolizantes de academia”, afirmou o chefe do Setor de Comunicação Social
da PRF em Goiás.
Medicamentos são feitos com substâncias químicas. Mesmo os produzidos
apenas com produtos naturais, quando ingeridos de forma incorreta, podem causar
males à saúde. “As pessoas não têm a formação e conhecimento suficiente para
compreender os riscos ou benefícios dos medicamentos em cada situação”, explica
o médico infectologista José David.
Desta forma, o Ministério da Saúde recomenda que os pacientes sempre
procurem uma unidade de saúde antes de ingerir qualquer medicamento e faça o
uso de forma como prescrito pelo profissional de saúde, evitando ingestão por
tempo ou quantidade acima do necessário ou mesmo interromper o tratamento antes
da hora. Além disso, é importante não se automedicar ou comprar de produtos sem
uma consulta prévia com um médico. Por fim, nunca compre ou use medicamentos
vencidos, de procedência duvidosa ou falsificados.
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