Em artigo divulgado
na revista Science, pesquisadores da China, Estados Unidos e Brasil
descreveram um material nanotecnológico que poderá ser útil na busca de
fármacos e testes para diagnóstico precoce de doenças como diabetes, câncer de
pâncreas, Alzheimer e Parkinson.
O trabalho, apoiado
pela FAPESP, envolveu nanobastões de ouro – material já bem conhecido e
utilizado na área da saúde, por exemplo, na terapia fotodinâmica contra
diferentes tipos de câncer. A novidade foi combinar essas nanopartículas a
peptídeos sintéticos semelhantes àqueles que, no corpo humano, formam as
chamadas placas amiloides – estruturas relacionadas com o desenvolvimento de
diversas doenças.
No organismo
saudável, os peptídeos amiloides estão presentes como moléculas isoladas
(conformação de hélice). Já em indivíduos com Alzheimer, por exemplo, esses peptídeos
encontram-se agregados (conformação conhecida como folha plana), formando
placas que prejudicam o funcionamento dos neurônios.
Normalmente, a
formação das placas amiloides – seja em humanos ou em animais usados como
modelo de estudo em laboratório – leva muitos meses ou até anos, o que
dificulta o teste de novos fármacos.
No artigo, o grupo
relata que a interação entre os nanobastões de ouro e os peptídeos amiloides
acelera esse processo, permitindo que ele seja mimetizado no laboratório em
poucas horas.
Os pesquisadores
também descobriram que, quando o material sintetizado encontra peptídeos
amiloides isolados, com estrutura de hélice – típicos de tecidos saudáveis –, a
forma como ele absorve e reflete a luz é diferente da que ocorre quando ele
encontra as moléculas agregadas em placas. Essa propriedade óptica, conhecida
como dicroísmo, pode ser explorada no desenvolvimento de instrumentos para
diagnóstico precoce de doenças associadas à presença da forma alterada do
peptídeo.
Toda a parte
experimental da pesquisa foi desenvolvida na Universidade de Jilin (China),
pelo grupo de Kun Liu, e na Universidade de Michigan (Estados Unidos), no
laboratório liderado por Nicholas Kotov. Também colaboraram pesquisadores da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade de São Paulo
(USP)
No Brasil, o
professor do Departamento de Química da UFSCar André Farias de
Moura foi responsável pela parte de simulação e modelagem computacional,
feita no supercomputador Santos Dumont. Seu objetivo foi entender o papel de
cada um dos elementos presentes na síntese do novo material: nanobastões,
peptídeos e surfactante (substância presente em sabões, xampus e produtos de
limpeza), explica Moura, que integra o time do Centro de Desenvolvimento
de Materiais Funcionais (CDMF), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e
Difusão (CEPIDs) da FAPESP.
“A demanda chegou
em agosto de 2020, com a parte experimental pronta. Eles sabiam que funcionava,
mas não o porquê. Nosso foco foi entender como as moléculas se organizavam na
superfície dos nanobastões”, conta o pesquisador à Coordenação de Comunicação
Social da UFSCar.
Essa compreensão
permite que a plataforma seja, no futuro, adaptada ao estudo de outras doenças,
entre elas a COVID-19. Umas das possibilidades é usar o nanomaterial para
detectar a proteína spike do SARS-CoV-2 ou anticorpos induzidos pelo vírus no
organismo humano.
“É ciência básica,
que abre todo um leque de aplicações até mesmo para problemas nem sequer
imaginados neste momento”, diz Moura.
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