O procurador-geral da República, Augusto Aras, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (28), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de medida cautelar, para suspender imediatamente o artigo 28 da Lei 13.988/2020.
A norma elimina o voto de
qualidade no Conselho Administrativo de Recurso Fiscais (Carf). O órgão, que
integra a estrutura do Ministério da Economia, é responsável por julgar
administrativamente, em segunda instância, os litígios tributários entre os
estados e a União. A mudança legislativa deu-se no Senado, em 24 de março,
quando houve a conversão em lei da Medida Provisória 899/2020, editada pelo
Executivo, para renegociar dívidas com as Unidades da Federação.
O voto de qualidade no Carf é dado pelo presidente do colegiado, em casos
de empate. Ocorre que, pela nova lei – que incluiu o artigo 19-E na Lei
10.522/2002 –, havendo o empate no julgamento do processo administrativo de
determinação e exigência do crédito tributário, a decisão passa a ser
automaticamente favorável ao contribuinte. Como consequência, estima o
Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil
(Sindifisco Nacional), a medida acarretará perda de créditos tributários de
aproximadamente R$ 60 bilhões anuais.
Na ação encaminhada ao Supremo, Aras aponta a existência de
inconstitucionalidade formal, por vício no processo legislativo. O motivo é a
inserção, em lei de conversão de medida provisória, de matéria de iniciativa
reservada e sem pertinência temática com o texto originário, por meio de emenda
parlamentar. Por não guardar afinidade com a matéria inicialmente tratada na MP
899/2020, prossegue o procurador-geral, há violação do princípio democrático e
do devido processo legislativo.
O chefe do Ministério Público da União chama a atenção para a discrepância
entre a proposição da MP 899 e a lei aprovada pelo Congresso. Enquanto a
primeira tratava da negociação extrajudicial de créditos tributários existentes
e constituídos, o artigo 28 da Lei 13.988/2020 disciplinou aspecto
procedimental do julgamento de processo administrativo, ou seja, tratou de um
tema alheio ao objeto original da medida provisória.
Essa prática, conforme lembrou o PGR, passou a não mais ser admitida pelo
Supremo desde o julgamento da ADI 5.127/DF, em maio de 2016, quando o STF
entendeu não ser possível o que ficou conhecido como “contrabando legislativo”.
Acrescenta Aras que, ao excluir o voto de qualidade, “o art. 19-E, incluído na
Lei 10.522/2002 pela Lei 13.988/2020, interferiu indevidamente no desempenho de
competências institucionais e na forma de atuação do Carf, órgão da
administração pública direta federal”. O PGR destaca que o artigo 28 da Lei
13.988/2020 viola os artigos 1º, caput e parágrafo único; 2º, caput; 61,
parágrafo 1º, inciso II, alínea “e”; e 84, inciso VI, da Constituição Federal.
Pedidos – O PGR
requer ao Supremo Tribunal Federal a concessão, monocrática e sem a intimação
dos interessados, de medida cautelar determinando a suspensão da eficácia da
norma impugnada, a ser oportunamente submetida a referendo do Plenário. Em
seguida, pede que se colham informações do Congresso Nacional e do presidente
da República, e que se ouça a Advocacia-Geral da União (AGU). Ao final, postula
que se julgue procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art.
28 da Lei 13.988/2020.
Tramitação – Em
24 de março deste ano, por procedimento de deliberação remota, o Senado aprovou
o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 2/2020, originário da MP 899. Em sua versão
original, a MP disciplinava as circunstâncias em que o Fisco poderia negociar
extrajudicialmente com seus devedores ou partes adversas, de forma a encerrar
processos ou a evitar o ajuizamento de ações relativas a créditos públicos já
existentes.
No entanto, durante o trâmite legislativo de conversão da MP 899 na Lei
13.988/2020, foi inserida matéria estranha ao texto original daquela
proposição, com o escopo de estabelecer o fim do voto de qualidade no caso de
empate nos julgamentos administrativos fiscais do Carf.
Para Augusto Aras, a discrepância temática entre o conteúdo original da MP
899/2020 e a disciplina inserida ao Projeto de Lei de Conversão 2/2020 por meio
de emenda parlamentar configura, portanto, violação da separação de poderes, do
devido processo legislativo e do princípio democrático.
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