O Ministério
Público de Santa Catarina (MPSC) e a Defensoria Pública do Estado (DPE-SC)
entraram com dois recursos - um para a educação infantil e outro para os
ensinos fundamental e médio - contra as decisões de 1º Grau que negaram os
pedidos de liminar para que fossem concedidos descontos e compensações nos
valores das mensalidades escolares devido à suspensão das aulas e atividades
presenciais como medidas de contenção à pandemia de covid-19.
Nos agravos de
instrumentos, assim como nas ações ajuizadas, os relatos dos pais comprovam que
a qualidade do serviço caiu muito e que, com as atividades na modalidade a
distância, as famílias passaram a arcar, em casa, com os custos e com as
responsabilidades de cuidados e de ensino - atribuições que eram das escolas.
As transcrições das
reclamações dos pais e os demais argumentos apontados nos recursos demonstram
"que a decisão foi equivocada e destoa da realidade", segundo a
Promotora de Justiça Analú Librelato Longo, da 29ª Promotoria de Justiça da
Capital, de defesa do consumidor.
Os agravos de
instrumento com pedido de tutela de urgência recursal foram protocolados no
Tribunal de Justiça no dia 4 de junho, pois a maioria dos vencimentos de
mensalidades ocorre no quinto dia útil de cada mês. Por isso, o MPSC e a DPE-SC
decidiram não aguardar até o limite do prazo para o recurso.
Ao contestar a
negativa da liminar, os autores do agravo - que também é assinado pela
Defensora Pública Ana Paula Berlatto Fao Fischer e pelo Promotor de Justiça
Eduardo Paladino, Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Consumidor do
MPSC - justificam o recurso porque a decisão de 1º Grau "passou ao largo
de vários pontos trazidos na inicial, comprovados pelas inúmeras reclamações
dos pais e alunos recebidas, cujas cópias também acompanham este recurso, e,
além disso, trouxe argumentos de cunho subjetivo e desacompanhados de uma
referência de origem".
Relatos de pais
contestam argumentos contra a liminar
Ao negar a liminar
que pedia descontos e compensações nas mensalidades como forma de manter o
equilíbrio contratual do serviço, o Juiz, conforme transcrito no recurso,
justificou a sua decisão afirmando que "as aulas continuam a ser
ministradas, o serviço continua a ser prestado, e conquanto sua qualidade possa
ser questionada, a contraprestação continua a ser devida".
Não foi isso o que
informaram os pais, que pagam pelo serviço, em suas reclamações à Ouvidoria do
MPSC.
Conforme a mãe de
uma menina registrou na Ouvidoria do MPSC, a "escola está fornecendo
somente três aulas via EAD com a minha filha do 1º ano, sendo que esses
encontros são no máximo de uma hora e meia. Ou seja, a escola não está dando
conta da grade curricular e ainda está cobrando os valores de forma
integral".
Em um dos relatos,
a mãe de uma aluna afirma que na prestação de contas da escola constavam
atividades que não ocorreram, "entre elas um passeio na escola no dia
23/04. E ao questionar o colégio, me disseram que foi escrito de forma lúdica.
Não estou pagando a escola para minha filha ser alfabetizada de forma lúdica!!
Está no 1º ano". Na data em que teria ocorrido o passeio, além das aulas
suspensas, o transporte escolar e coletivo também estavam proibidos como
medidas de combate à pandemia de covid-19. A reclamação dessa mãe foi
registrada na Ouvidoria do MPSC no dia 18 de maio.
Outro argumento que
embasou a negativa à liminar foi que a suspensão das aulas presenciais,
substituídas por aulas remotas, não geraria prejuízo aos pais.
Mais uma vez, a
reclamação feita por outra mãe à Ouvidoria contesta a alegação. "A última
aula presencial foi no dia 15/03. Sem nenhuma organização prévia, de tarde
recebemos o comunicado que a escola estaria fechada por causa do coronavírus.
Os alunos guardam cadernos e outros materiais na escola, mas não foram avisados
no dia 15 para levarem seus materiais pessoais para casa. Estamos desde o dia
16 de março imprimindo todo conteúdo de aula, uma vez que a escola não adota
livros pedagógicos", descreve o relato enviado à 29ª PJ da Capital no dia
3 de junho, portanto, na véspera do ingresso do agravo de instrumento.
Ao mesmo tempo em
que os valores das mensalidades são mantidos - fato que por si só já causaria a
oneração dos pais -, outros custos decorrentes de migração das aulas
presenciais para o ensino remoto, de acordo com os agravos, obrigaram as
famílias a novos investimentos para os quais não estavam preparadas: melhoria
dos serviços de internet e, muitas vezes, novos equipamentos de informática, já
que os pais também tiveram que trabalhar em casa e nem sempre foi possível
compartilhar computadores, e até mesmo aumento dos gastos residenciais com água
e energia, que passaram a ser consumidos em casa pelos filhos que estariam nas
escolas.
Liminar pode
reduzir inadimplência e manter empregos
Nos agravos, todos
os outros argumentos que levaram à decisão de negar a liminar são contestados.
O recurso rebate,
também, as alegações de que os percentuais de descontos pedidos na liminar não
teriam base ou fundamento contábil que justificasse propostas iguais para
escolas diferentes. Segundo o agravo, foram mais de dois meses de prazo para as
escolas iniciarem as negociações com os pais e apresentarem as propostas de
descontos de acordo com as próprias capacidades. Além disso, essa ponderação
existe no pedido, já que os percentuais requeridos levam em conta o porte e a
capacidade das escolas.
A Promotora de
Justiça ainda salienta que os descontos e compensações pedidos nas medidas
liminares podem evitar o colapso das escolas privadas e a consequente
sobrecarga na rede pública de ensino.
A manutenção do
equilíbrio contratual permitiria que muitos pais, com a redução dos valores das
mensalidades, continuassem mantendo os filhos matriculados no ensino particular,
mesmo com as perdas de renda decorrentes da pandemia.
"A negativa em
reequilibrar os contratos escolares neste momento é um forte combustível à
inadimplência e ao trancamento dos contratos em efeito cascata, como acima
enfatizado, fato que pode comprometer de forma indelével o funcionamento da
atividade econômica educacional e, por consequência, os empregos dos
profissionais de ensino", contrapõe o recurso.
Relembre, nos
quadros abaixo, o que foi pedido nas liminares.
ESCOLAS DO
ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO
Revisão
de todos os contratos de prestação de serviços educacionais referentes ao
ensino médio e fundamental para que seja realizado o abatimento proporcional no
percentual abaixo indicado, no mínimo, do valor das mensalidades escolares, não
cumulativo com outros descontos já concedidos por outros motivos, retroativo a
19 de março de 2020 (vigência do Decreto Estadual n. 509/2020), e até que haja
liberação, pelas autoridades governamentais e sanitárias, para o retorno às
aulas presenciais, ou possibilitar a rescisão contratual, à escolha do
consumidor, sem qualquer ônus:
10%, no
mínimo, para as instituições de ensino com até 200 alunos matriculados no
ensino fundamental/médio;
20%, no
mínimo, para as instituições de ensino com mais de 200 e até 300 alunos
matriculados no ensino fundamental/médio;
30% de
desconto, no mínimo, para as instituições de ensino com mais de 300 alunos
matriculados no ensino fundamental/médio.
Deixar
de cobrar as atividades acessórias ao contrato principal que não sejam
compatíveis com as atividades a distância, desde 19 de março de 2020 (vigência
do Decreto Estadual n. 509/2020), e até que haja a liberação, pelas autoridades
governamentais e sanitárias, para o retorno às aulas presenciais.
Deixar
de exigir ou condicionar a qualquer tipo de encargo, cláusula penal ou multa,
os pedidos de rescisão ou suspensão dos contratos escolares.
Disponibilizar
equipe técnica destinada ao atendimento dos pais e/ou alunos que tiverem
dificuldades técnicas de acesso à plataforma digital adotada para o ensino a
distância.
Disponibilizar
canais de comunicação, inclusive online e por correio eletrônico, a fim de
prestar todas as informações e esclarecer todas as dúvidas de qualquer
natureza, seja de cunho administrativo, financeiro ou pedagógico.
Pagamento
de multa diária de R$ 5.000,00 por contrato, em caso de descumprimento das
medidas requeridas nos itens anteriores.
CRECHES E
PRÉ-ESCOLAS
Revisão
de todos os contratos de prestação de serviços educacionais referentes à
educação infantil para que seja realizado o abatimento proporcional no
percentual abaixo indicado, no mínimo, do valor das mensalidades escolares, não
cumulativo com outros descontos já concedidos por outros motivos, retroativo a
19 de março de 2020 (vigência do Decreto Estadual n. 509/2020), e até que haja
liberação, pelas autoridades governamentais e sanitárias, para o retorno às
aulas presenciais, ou possibilitar a rescisão contratual, à escolha do
consumidor, sem qualquer ônus:
15%, no
mínimo, para as instituições de ensino com até 100 alunos, matriculados na
educação infantil;
25%, no
mínimo, para as instituições de ensino com mais de 100 e até 200 alunos,
matriculados na educação infantil;
35% de
desconto, no mínimo, para as instituições de ensino com mais de 200 alunos
matriculados na educação infantil.
Deixar
de cobrar as atividades acessórias ao contrato principal que não sejam
compatíveis com as atividades a distância, desde 19 de março de 2020 (vigência
do Decreto Estadual n. 509/2020), e até que haja a liberação, pelas autoridades
governamentais e sanitárias, para o retorno às aulas presenciais.
Deixar
de exigir ou condicionar a qualquer tipo de encargo, cláusula penal ou multa,
os pedidos de rescisão ou suspensão dos contratos escolares.
Disponibilizar
equipe técnica destinada ao atendimento dos pais e/ou alunos que tiverem
dificuldades técnicas de acesso à plataforma digital adotada para o ensino a
distância.
Disponibilizar
canais de comunicação, inclusive online e por correio eletrônico, a fim de
prestar todas as informações e esclarecer todas as dúvidas de qualquer
natureza, seja de cunho administrativo, financeiro ou pedagógico.
Pagamento
de multa diária de R$ 5.000,00 por contrato, em caso de descumprimento das
medidas requeridas nos itens anteriores.
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