A Comissão de
Constituição de Justiça (CCJ) do Senado deve votar, nesta quarta-feira (4), a
chamada PEC dos Fundos (187/2019), projeto que pode desbloquear e repassar ao
governo R$ 220 bilhões para o pagamento da dívida pública e o investimento em
serviços básicos para a população. Esse valor bilionário teria como origem a
extinção de 248 fundos criados por lei, mas que não estão previstos na
Constituição, como o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e o Fundo de
Universalização das Telecomunicações (Fust).
Com as contas no
vermelho e mais de R$ 4 trilhões de dívida pública, segundo o Ministério da
Economia, representantes do governo argumentam que a PEC vai dar uma nova
funcionalidade ao dinheiro parado nesses fundos. Diante desse cenário, o
relator da matéria na CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), acredita que o texto
deve ser aprovado sem mudanças, já que considera a vinculação de verba a fundos
públicos como um “atraso”. “Imagine que você tem um problema de natureza
ambiental, como as chuvas que destruíram Belo Horizonte, São Paulo e Rio de
Janeiro, por exemplo. O governo tendo dinheiro vinculado, não pode ser usado
para socorrer os estados”, exemplifica.
Além de dar mais
liberdade ao governo para definir o que fazer com o dinheiro desses fundos,
Otto Alencar lembra que as reservas a serem extintas acumulam recursos que não
são utilizados. “Todos nós pagamos uma taxa sobre a telefonia móvel e parte
dela vai para o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações
(FUST). No ano passado, esse fundo tinha em caixa R$ 1,4 bilhão e só aplicou R$
5 mil. Esse dinheiro todo fica parado. Outro exemplo: o Fundo da Marinha
Mercante (FMM) vem também de taxas cobradas pela atividade de portos e marinha.
Tinha R$ 9 bilhões no ano passado e nunca foi aplicado em absolutamente nada”,
critica o senador.
A PEC estabelece
também que as verbas que perderem vinculação, ou seja, que não tiverem um
percentual fixo de receitas, devem ser alocadas em investimentos. No texto,
estão previstos, por exemplo, o uso dos R$ 220 bilhões em projetos de
erradicação da pobreza, implantação e conclusão de rodovias e ferrovias e
interiorização do gás natural produzido no país.
Para o senador
Vanderlan Cardoso (PP-GO), a aprovação da PEC dos Fundos pode movimentar a
economia e atender a anseios dos brasileiros. “O Brasil não tem condição de
deixar esses recursos parados, enquanto a população precisa de mais
investimentos em saúde, educação, segurança e em geração de emprego e renda”,
pontua.
“O dinheiro girando
movimenta a economia de todo o setor produtivo. É justamente o que o Brasil
precisa atualmente. Eu falei da construção civil, mas isso pode ser feito com o
agronegócio, o setor de serviço, os arranjos produtivos locais e tantos outros
setores”, aponta o parlamentar, que entende também que o dinheiro pode ser
usado em programas habitacionais.
O secretário
adjunto da Secretaria de Orçamento Federal, Geraldo Julião, esclarece que os
Fundos de Participação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (FPM)
e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização
dos Profissionais da Educação (FUNDEB), por exemplo, não serão afetados com a
PEC.
Segundo ele, hoje,
a lei vigente favorece o congelamento das verbas de fundos
infraconstitucionais, que poderiam ter uma aplicação melhor. “Hoje, é como se o
governo fosse uma pessoa que está com muito dinheiro aplicado na poupança, mas
que está usando o cheque especial. Economicamente isso não tem lógica”, compara
Julião.
Juros mais
baixos
Na avaliação do
professor de finanças do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC)
Alexandre Rocha, o pagamento gradual da dívida pública, conhecido como
amortização, será “positiva” para o país porque deve influenciar a taxa de
juros no Brasil. “O setor privado vai poder se endividar por um custo menor e
investir por um custo menor. Isso é bom para a sociedade como um todo”,
argumenta. Ele explica que, uma vez que os juros estejam menores, as empresas
conseguem investir mais e, com isso, tendem a contratar mais funcionários.
Desde que chegou ao
Senado, enviada pelo Executivo, a PEC 187/2019 já passou por mudanças. O
relator na CCJ do Senado, Otto Alencar, restringiu a medida aos fundos que
tenham sido criados até o fim de 2016 e deu proteção às reservas que foram
criados por lei, mas que geram receitas previstas na Constituição ou nas Leis Orgânicas
dos estados e do DF. Com essa mudança, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT),
que custeia o seguro-desemprego e o abono salarial e poderia deixar de existir,
foi mantido, ao contrário do que previa o texto original do governo.
Se a PEC for
aprovada com a redação atual, o Congresso Nacional terá dois anos para escolher
quais fundos públicos devem continuar existindo. Essa garantia será feita com
base em projetos de lei complementares. Aqueles fundos que não passarem por
esse processo vão deixar de existir automaticamente e terão a verba realocada.
O texto faz parte
de um pacote de medidas, batizado de “Plano Mais Brasil”, que pretende dar
margem de investimento ao governo federal. Isso porque, segundo o Executivo,
97% dos recursos da União são vinculados, ou seja, já entram no caixa com um
destino específico, o que diminui a capacidade de realocação dos gestores.
Apesar de ser a
proposta do pacote econômico que tramita com mais rapidez, a PEC dos Fundos
ainda tem um longo caminho pela frente. Caso seja aprovada pela CCJ do Senado,
precisa passar por análise de comissão especial que ainda será criada e repetir
o processo na Câmara dos Deputados.
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