Vereadores argumentaram que Maria Tereza denegriu a imagem de SãoMiguel do Oeste no país e no exterior (Foto: Ascom/Câmara)
Em sessão
extraordinária, que durou mais de nove horas e encerrou após as 3h da madrugada
de sábado (4), a Câmara Municipal de São Miguel do Oeste cassou o mandato da
vereadora Maria Tereza Capra (PT) por quebra de decoro parlamentar. Os itens do
relatório final da Comissão de Inquérito do Conselho de Ética e Decoro
Parlamentar que pediam a cassação da vereadora foram aprovados por 10 votos.
Votaram favorável à
cassação os vereadores Carlos Agostini (MDB), Elói Bortolotti (PSD), Gilmar
Baldissera (PP), Moacir Fiorini (MDB), Nélvio Paludo (PSD), Paulo Drumm (PSD),
Ravier Centenaro (PSD), Valnir Scharnoski (PL), Vilmar Bonora (PSD) e Vanirto
Conrad (PDT). Somente Maria Tereza Capra votou contra, e Cris Zanatta (PSDB)
não participou da sessão. A sessão foi presidida por Vagner Passos (sem
partido), que votaria somente em caso de empate.
A Comissão de
Inquérito foi criada para apurar denúncias recebidas em novembro de 2022 contra
a vereadora Maria Tereza Capra. A Comissão foi composta por Carlos Roberto
Agostini (MDB), Gilmar Baldissera (PP) e Ravier Centenaro (PSD) e apurou
denúncias que citavam, em resumo, vídeo publicado pela vereadora Maria Tereza
Capra e a acusavam de ter utilizado sua rede social Instagram para “propagar
notícias falsas e atribuir aos cidadãos de Santa Catarina e ao Município de São
Miguel do Oeste o crime de fazer saudação nazista e ser berço de célula
neonazista”; e ter sido condenada por prática de crime contra a lei de
licitações, na época em que exercia a função de secretária municipal de
Cultura.
RITOS DA SESSÃO
Diante do plenário
lotado, o presidente Vagner Passos apresentou orientações gerais sobre a noite,
pediu a colaboração dos assistentes e explicou os ritos, que começariam com a
leitura das denúncias, do relatório final da Comissão de Inquérito Parlamentar,
e das peças processuais solicitadas pela defesa. Passos ressaltou que na
sequência a defesa terá o prazo de duas horas para fazer a sustentação oral.
Por fim, explicou que concluída a defesa, serão realizadas tantas votações
nominais quantas forem as infrações articuladas nas denúncias e vertidas no
relatório final da Comissão de Inquérito. Destacou que são três fatos, e que
para cada um, cada parlamentar terá até 15 minutos de fala.
Vagner Passos
explicou que das duas denúncias se extrai a existência de três fatos; que cada
votação deve alcançar o voto de dois terços, pelo menos, dos membros presentes
e votantes, em curso de qualquer das infrações especificadas nas denúncias,
para ser aprovada. Disse que concluído o julgamento, será proclamado
imediatamente o resultado, com lavratura de ata que consigne a votação nominal
sobre cada infração e, se houver condenação, expedirá o competente decreto
legislativo de cassação do mandato. Passos ressaltou que no caso de o resultado
da votação ser absolutório, o presidente determinará o arquivamento do
processo. Citou que em qualquer dos casos, a Justiça Eleitoral será comunicada
sobre o resultado.
LEITURA DO
PROCESSO
Na sequência o
primeiro-secretário da Mesa Diretora, Moacir Fiorini (MDB), leu as denúncias
oferecidas contra a vereadora. Dando sequência, o segundo-secretário, Ravier
Centenaro (PSD), leu o relatório final da Comissão de Inquérito Parlamentar da
Comissão de Ética e Decoro Parlamentar. Moacir Fiorini retomou a leitura com as
peças processuais solicitadas pela defesa (pedido de impedimento, alegação final,
artigo acadêmico, reportagens, ofício do Senado e quesitos).
ALEGAÇÕES DA
DEFESA
Nas alegações
finais, ou seja, na defesa da vereadora Maria Tereza Capra (PT), a defesa
argumentou sobre a suposta parcialidade do então presidente da Câmara, Vanirto
Conrad, e de dois dos três membros da Comissão de Inquérito, Ravier Centenaro e
Carlos Agostini; apontou supostas falhas e vícios do processo, como a inépcia
das denúncias populares, em que as peças acusatórias não descrevem a quebra de
decoro; e afirma que a Comissão de Inquérito Parlamentar proferiu decisões
“arbitrárias e contraditórias”, entre outras supostas falhas do processo e o
cerceamento de defesa. Por fim, a defesa rebateu as questões de mérito.
Em resumo, a defesa
pede a declaração de nulidade do procedimento ético disciplinar; a elaboração,
pela Comissão de Inquérito Parlamentar, de parecer conclusivo pelo arquivamento
do procedimento administrativo; que sejam julgados improcedentes os pedidos
deduzidos nas representações, com a subsequente absolvição da vereadora, tendo
em vista a não comprovação de prática de quebra de decoro parlamentar pela
denunciada; e “na improvável hipótese de alguma procedência do presente
procedimento, que não seja aplicada a penalidade de cassação do mandato”.
SUSTENTAÇÃO ORAL
Na sustentação oral
da defesa, iniciada já após as 23h desta sexta-feira (3), a vereadora Maria
Tereza Capra agradeceu o apoio de seu partido, com dezenas de membros presentes
à sessão; falou das ameaças que recebeu desde novembro, especialmente via redes
sociais; citou que esse é seu terceiro mandato, e que aprendeu muito durante a
vereança. Capra manifestou aos colegas que muitas vezes é possível mudar seu
voto no decorrer do processo, após ter outros entendimentos.
Em relação às
denúncias, Capra disse que nem tudo é o que parece; afirmou que não foi ela
quem gravou o vídeo (que viralizou), mas que fez um comentário em outro vídeo,
em seu Instagram com 1.800 seguidores, e que o vídeo ficou por cerca de uma
hora no ar, pois retirou-o depois de receber vários comentários. Criticou a
Câmara que fez uma moção de repúdio no dia 3 de novembro de 2022, sugerindo que
em vez disso a Câmara poderia ter feito uma reunião para refletir sobre o
simbolismo do gesto feito em frente ao quartel.
Capra citou
situações vividas na Câmara em que poderia pedir, mas não pediu, quebra de
decoro parlamentar de colegas vereadores. Por fim, Maria Tereza dissertou sobre
as dificuldades da mulher entrar na política, como a dupla jornada, com a
criação dos filhos. Ainda, lamentou que não foi ela quem divulgou o vídeo que
viralizou, e sim pessoas que estavam nas manifestações.
Maria Tereza disse
que é no parlamento onde é possível equilibrar um pouco as forças; que estão
aqui 11 homens, uma vereadora está ausente, e uma vereadora que vai ser
cassada. “Isso é representatividade?”, questionou. Ela afirmou que a luta pela
representatividade da mulher irá continuar, com ou sem ela. Ainda apelou para
que os vereadores poderiam “fazer história” nessa noite, pedindo que os
vereadores votassem contra o relatório.
Seguindo a
sustentação oral da defesa, o advogado Sérgio Graziano falou da lealdade na
política. Ressaltou que o processo é de perseguição política, que não há
qualquer fato jurídico, político ou social que justifique o pedido de cassação.
Afirmou que em seus 31 anos de advocacia, em todas as suas defesas jamais viu
tamanha injustiça. Disse que espera que a Câmara reconheça a exuberância e a
honradez de Maria Tereza Capra.
Na sequência,
Graziano focou sua fala na defesa da imunidade parlamentar. “Está na hora dessa
Casa Legislativa mostrar que a imunidade parlamentar não é um privilégio da
pessoa física, do parlamentar ou da parlamentar. Ela existe para proteger o
pensamento, especialmente o pensamento das minorias”, argumentou.
Graziano falou que
todos os votos depositados nos vereadores têm o mesmo valor, que é a outorga
que a população deu para os vereadores e para Maria Tereza Capra. Disse que os
vereadores de São Miguel do Oeste querem relativizar o valor do voto. O advogado
explanou sobre as garantias existentes para os membros do Poder Judiciário,
comparando com a imunidade parlamentar, garantia dos membros do Poder
Legislativo, ressaltando que são garantias para a sociedade. “Só faz sentido um
vereador ter imunidade se for para servir à coletividade, senão não faz
sentido”, afirmou. O representante da defesa disse que quando os vereadores se
elegem, suas manifestações e votos são imaculados, indefectíveis, e o que
garante isso é a imunidade parlamentar.
Sérgio Graziano
disse que compreende a indignação de parte da população ao ver o vídeo de Maria
Tereza Capra, em que esta repudia um gesto, comparando-o ao gesto feito no
nazismo, que representa o que de pior há na humanidade. Ele afirmou que no
vídeo Maria não ofendeu nenhuma pessoa, não citou nenhuma pessoa, não fez
nenhum movimento judicial para criminalizar qualquer um que estava naquelas
manifestações.
“Não é comum ouvir
o Hino Nacional com a mão estendida daquela forma. Nem a força militar faz
isso”, apontou. “Quando a Maria Tereza Capra faz esse vídeo, já estava em curso
a investigação promovida pelo Ministério Público, para saber se ali existia ou
não um crime de incitação ao ódio, ou crime de atos antidemocráticos”,
relembra.
O advogado citou
moção de apelo aprovada nesta semana na Câmara, pedindo a veículos de imprensa
que divulgassem o resultado da investigação do MP; ele afirmou que na moção os
próprios vereadores entendem que não foi a partir do vídeo de Maria Tereza que
São Miguel do Oeste ficou conhecida como “terra de nazistas”, ressaltando que o
vídeo foi divulgado inclusive pela imprensa nacional. “Os senhores reconhecem
que não foi Maria Tereza Capra quem fez a divulgação”, afirmou, novamente
citando a moção.
Graziano disse que
tem certeza de que as pessoas da manifestação não tiveram a intenção de fazer
saudação nazista. E citou outros símbolos que não devem ser feitos, como o que
representa “white power”, com gesto feito com as mãos, ou mesmo tomar copo de
leite em público, símbolos de supremacistas brancos. E comparou com o braço com
o gesto estendido que, afirmou, o mundo e até a imprensa local entenderam como
um gesto nazista. “Esses gestos, pelo seu simbolismo e representação histórica,
devem ser evitados”, afirmou. Disse que não se pode responsabilizar Maria
Tereza Capra por ter visto um gesto nazista naquela manifestação, quando todos
interpretaram dessa forma até que houvesse a explicação por parte dos
manifestantes.
Na sequência,
Sérgio Graziano falou sobre o outro fato presente na denúncia, sobre a condenação
de Maria Tereza Capra por crime contra a lei de licitações. Ele destacou que
esse crime foi eliminado na nova lei de licitações, por ser um erro formal no
processo. “Esse fato deixou de ser crime, é simples”, afirmou, ao destacar que
é “gigantesca” a chance de Maria Tereza Capra ser inocentada na justiça em
relação a essa condenação.
Ao final, Graziano
fez um apelo aos vereadores. Disse que a possível cassação de Capra macularia a
imagem da Câmara, ao usar o “verniz da legalidade” para encobrir uma perseguição
política. “Se essa Câmara tiver consciência, ela pode sair muito maior do que
começou essa sessão de hoje”, afirmou. Ele pediu o arquivamento da denúncia e,
se não for possível, que a pena seja a de advertência.
VOTOS
Os vereadores
votaram três itens previstos nas denúncias e no relatório final da Comissão de
Inquérito. O primeiro item é o não conhecimento de um dos fatos contido na
denúncia de protocolo nº 2929, visto que de competência exclusiva do Poder
Judiciário, ou seja, pelo arquivamento desse fato. O item foi aprovado por
unanimidade dos vereadores presentes.
Antes da votação do
segundo item, Maria Tereza Capra ressaltou que a defesa fez um pedido de uma
pena alternativa, de advertência, em vez de perda do mandato. O presidente
Vagner Passos fez nova pausa na sessão para os vereadores deliberarem sobre o
pedido.
No retorno, Vagner
Passos colocou em votação a tese de defesa pelo arquivamento, em relação ao
segundo item (conhecimento dos pedidos delineados nas denúncias de protocolo nº
2929 e 2957, relativos ao vídeo produzido e veiculado). A tese de arquivamento
foi rejeitada por 10 votos a um, com voto favorável apenas de Maria Tereza
Capra. Em sequência foi votada a tese da defesa pela desclassificação, com pena
alternativa de advertência, também em relação ao segundo item. A tese de
desclassificação foi rejeitada por 10 votos a um, com voto favorável apenas de
Maria Tereza Capra.
CASSAÇÃO DO
MANDATO
Rejeitadas as teses
da defesa, deu-se seguimento à votação dos demais itens do relatório da Comissão
de Inquérito Parlamentar. O segundo item do relatório é o conhecimento dos
pedidos delineados nas denúncias de protocolo nº 2929 e 2957, relativos ao
vídeo produzido e veiculado, e por consequência cassar o mandato da vereadora
Maria Tereza Capra, decretando a perda do mandato. O item foi aprovado por 10
votos a um, com voto contrário apenas de Maria Tereza Capra, que se ausentou da
sessão após proferir o voto.
Já o terceiro item
é o fato II, delineado na denúncia de protocolo nº 2957 – em relação à
condenação em segunda instância por órgão colegiado, a seis anos de detenção, a
ser cumprida em regime inicial semiaberto, por prática de crime contra a lei de
licitações perpetrado contra esse município –, conhecendo no todo, dando
provimento para cassar o mandato da vereadora Maria Tereza Capra, decretando a
perda do mandato. Novamente os vereadores fizeram votação nominal das teses da
defesa, que pedia o arquivamento ou a desclassificação, e a rejeitaram por
unanimidade. Já a conclusão da Comissão de Inquérito, que pedia a cassação, foi
aprovada por 10 votos. Maria Tereza Capra já havia se retirado da sessão e não
votou.
Com o resultado da
votação, o presidente Vagner Passos anunciou a perda do mandato da vereadora
Maria Tereza Capra. Com a cassação da vereadora, o primeiro suplente do Partido
dos Trabalhadores deve ser convocado para assumir a cadeira de Capra na Câmara.
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