A Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa)abre nesta quarta-feira (31)
consulta pública para duas propostas que pretendem regulamentar o cultivo de
maconha para fins medicinais e científicos no Brasil. Este é passo seguinte
da medida aprovada pela diretoria colegiada da Anvisa, em
junho deste ano.
A agência informou em comunicado que organizará uma audiência pública em
Brasília marcando o início desta consulta. Dividida em duas etapas, a reunião
abordará na parte da manhã a regulamentação do cultivo de Cannabis sativa para fins medicinais
e científicos.
No período da tarde a pauta cobrirá os procedimentos específicos para registro e monitoramento de medicamentos feitos com base na planta ou de seus derivados. A audiência desta quarta faz parte do processo iniciado em junho. A consulta estará aberta até o dia 19 de agosto na plataforma da Anvisa.
O plantio doméstico de maconha por pessoas físicas e para o consumo
recreativo continuará proibido no país. Os documentos preveem que apenas
empresas possam cultivar a planta em ambientes controlados sob supervisão da
Anvisa e de autoridades policiais, e que a venda seja feita diretamente para a
indústria farmacêutica ou entidades de pesquisa. (veja abaixo os detalhes das duas propostas).
O que propõem as duas resoluções
Cultivo
Uma das resoluções a serem avaliadas tem como objetivo a regulamentação
dos requisitos técnicos e administrativos para o cultivo da planta com fins medicinais
e científicos – desde o plantio até a fase de secagem e distribuição.
A resolução prevê o cultivo somente em sistemas de ambiente fechado e
por pessoas jurídicas. O cidadão comum (pessoa física) não poderia ter pés de
maconha em casa. Para cultivar, seria preciso ter uma autorização especial da
Anvisa e supervisão da Polícia Federal.
Essa inspeção da agência reguladora exigiria, entre outras coisas, um
rígido sistema de segurança com controle de acesso por biometria, alarmes e
proteção de janelas duplas. Além disso, o local não pode ter identificação
externa.
A venda e a entrega da planta produzida seriam somente para instituições
de pesquisa, fabricantes de insumos farmacêuticos e fabricantes de
medicamentos. O transporte teria de ser feito em veículos especiais.
A autorização para cultivo valeria por 2 anos, podendo ser renovada, e
haveria uma cota de cultivo e controle de estoques e de liberação do produto.
Medicamentos
A segunda resolução tem como objetivo definir procedimentos específicos
para registro e monitoramento de medicamentos à base decannabis, seus derivados e análogos
sintéticos. Isso inclui os fitoterápicos.
A regulamentação se aplica aos medicamentos nas formas de cápsula,
comprimido, pó, líquido, solução ou suspensão (misturas) com administração por
via oral.
As próprias empresas deveriam pedir à Anvisa o registro para produção
desses medicamentos. Atualmente, há somente um medicamento com cannabis
registrado no Brasil, o Mevatyl.
Não haveria uma lista prévia de doenças: a agência analisará registro
por registro, conforme os pedidos. Medicamentos já registrados em outros países
deverão apresentar relatório técnico de avaliação do remédio emitido pelas
respectivas autoridades reguladoras.
O registro inicial teria validade de 3 anos e as renovações seguintes,
de 5 anos. Geralmente, para os outros medicamentos, o primeiro registro já vale
por 5 anos.
Depois de aprovado o registro, a empresa teria 30 dias para definição do
preço máximo e 365 dias para colocar o remédio no mercado. A resolução já prevê
a venda em farmácias. A maioria deve ser com retenção de receita médica, mas
cada caso seria analisado individualmente.
Neste momento, a Anvisa não tem nenhum pedido de registro pendente.
Haveria, pela proposta, um monitoramento do mercado com fiscalização
constante e canais de atendimento para dúvidas de consumidores.
Entidades se posicionam contra
proposta
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de
Psiquiatria (ABP) se posicionaram contra a regulamentação do plantio de cannabis no
Brasil. A decisão pede a revogação e o cancelamento da abertura
de consulta pública sobre o tema.
Segundo o texto, a decisão da Anvisa "desconsidera evidências
científicas e não garante efetividade e segurança para os pacientes".
Segundo o presidente do CFM, Carlos Vital, "a maconha não é uma droga
inofensiva e são vastas as evidências científicas de que o uso precoce da droga
leva à dependência".
"Acreditamos que é nossa missão informar e conscientizar a
comunidade médica e científica, bem como educadores, legisladores, gestores e o
público em geral, sobre o tema", se posiciona Vital, em nota.
Regras atuais
Atualmente, é proibido cultivar a planta de cannabis em território brasileiro. A
lei determina que quem produz a cannabis para
consumo pessoal está sujeito à prestação de serviços à comunidade e ao
comparecimento a programa educativo, sem fazer ressalva ao uso médico.
Mas, nos últimos anos, a Anvisa e o Poder Judiciário já deram alguns
passos no sentido de liberar o cultivo da planta para fins medicinais e
científicos. Veja alguns deles abaixo:
Janeiro de 2015: Retirada do canabidiol da
lista de substâncias de uso proscrito, abrindo caminho para
facilitar a comercialização de medicamentos com a substância no país;
Março de 2016: Autorização da prescrição de remédios à
base de canabidiol e THC no Brasil;
Janeiro de 2017: Registro do primeiro remédio à base
de maconha no Brasil, o Mevatyl, droga já aprovada em outros 28
países;
Abril de 2017: A Justiça Federal na Paraíba autorizou uma associação
de João Pessoa a cultivar maconha para fins exclusivamente
medicinais;
Maio de 2017: Inclusão da Cannabis sativa na Lista Completa
das Denominações Comuns Brasileiras (DCB) sob a categoria de
"planta medicinal".
Junho de 2019: Diretoria colegiada da Anvisa aprova propostas que podem
liberar o cultivo de maconha medicinal para indústria e
ciência.
A ideia é que, ao regulamentar o cultivo da planta, caia o custo da
produção de medicamentos com base na Cannabis sativa, e que se reduza também o
número de ações judiciais para compra de remédios não registrados no Brasil.
Pacientes que sofrem de diversas doenças podem ser beneficiados com a
mudança na regras, entre eles os que têm esclerose múltipla, autismo e dores
crônicas oncológicas.
As propostas avaliadas nesta terça não preveem a liberação do cultivo
nem do consumo de maconha para fins recreativos.
DEIXE UM COMENTÁRIO
Facebook