Marca de respiradores comprada pela Saúde de SC é desaprovada por médicos britânicos

04/05/2020 - 10h36

Médicos britânicos recomendaram a devolução de 250 respiradores da marca Aeonmed, modelo Shangrilá 510S. Segundo os profissionais, o equipamento não é adequado para uso em UTIs e pode levar pacientes da Covid-19 à morte devido à baixa capacidade. A marca e o modelo são os mesmos adquiridos pelo governo catarinense na polêmica dispensa de licitação que culminou com a queda do secretário da Saúde Helton de Souza Zeferino.

No entanto, segundo documentos incluídos posterior a efetivação da compra no processo, o modelo brasileiro tinha um diferencial que seria uma miniestação acoplada, diferente dos equipamentos reprovados pelos intensivistas ingleses.

A informação foi divulgada pela rede americana NBC News, que teve acesso ao laudo dos médicos após análise dos equipamentos.

“Acreditamos que, se usado, é provável que haja danos significativos ao paciente, incluindo a morte”, diz trecho da carta escrita pelos médicos. “Estamos ansiosos para a retirada e substituição desses ventiladores por dispositivos mais capazes de fornecer ventilação em terapia intensiva para nossos pacientes”, completam os profissionais.

Os equipamentos da Aeonmed não eram a preferência no processo de dispensa de licitação da Secretaria de Saúde. Quando o negócio foi fechado, em 26 de março, o modelo escolhido havia sido o Medical C3, da empresa CIMA, com sede no Panamá. Na proposta inicial, os 200 respiradores custariam os mesmos R$ 33 milhões da proposta de licitação.

No entanto, curiosamente, a empresa Veigamed, que foi a escolhida para intermediar a compra, anunciou a troca de modelos pelo Shangrilá, que total custaria R$ 12 milhões, bem abaixo do valor contratado.

Em comunicado enviado à Secretaria de Saúde, o CEO da Veigamed, Pedro Nascimento, afirmou que a troca de modelo foi acertada com o secretário Helton de Souza Zeferino, mas não há em todo o processo documento que ponte para essa negociação. Questionado, ele não informou como foi essa troca de modelo.

Pistas no processo de dispensa de licitação apontam que a intenção seria desde o início trazer os modelos Shangrilá. Prova disso estão nas duas propostas de orçamento fraudadas e incluídas no processo. Apesar de elas informarem que os orçamentos eram para o modelo Medical C3, as imagens que apareciam nas propostas eram exatamente do modelo Shagrilá 510S.

Se não bastasse, os equipamentos que deveriam ser entregues em duas etapas, a primeira carga com 100 respiradores em 7 de abril e a outra em 30 de abril, até hoje não chegaram ao estado. Os R$ 33 milhões, valor bem acima do valor de custo dos equipamentos, já foi pago à Veigamed e a Justiça mandou bloquear os valores.

Respiradores catarinenses variam entre R$ 2 mil e R$ 20 mil

Esta semana, o Congresso deve votar o projeto de lei do deputado Carlos Chiodini (MDB) que autoriza, em regime extraordinário, qualquer empresa com condições técnicas, independentemente de seu objeto social, de fabricar respiradores para a pandemia.

Em Santa Catarina, pelo menos três empresas já estão produzindo esses equipamentos. Uma delas é a WEG, empresa de energia, que informou direcionar a sua linha de produção para fazer respiradores licenciados pela Leitsung, que já produz esses equipamentos. A capacidade de produção da WEG é de 50 respiradores por dia.

As outras duas empresas, que seriam beneficiadas pelo projeto de lei apresentado por Chiodini, são a Autom, de Santa Cecília, que já teve “sinal verde” e está na fase final de apresentação de documentos, e a Bold, de Jaraguá do Sul, que recentemente teve os testes clínicos do equipamento aprovados, restando apenas a aprovação técnica da Agência.

O senador Dário Berger (MDB) tem articulado com a Anvisa a liberação das licenças necessárias para a comercialização dos equipamentos.

A Bold, segundo a empresa, pode fabricar até 400 aparelhos por dia. Embora o aparelho desenvolvido pela Bold, não seja aquele completo de UTI, pode ser usado em 93% dos casos de Covid-19, e o preço gira em torno de R$ 20 mil.

Já os engenheiros do AUTOM de Santa Cecília, informaram que podem produzir 50 equipamentos por dia ao preço final de R$ 2 mil.

“Diversas pessoas estão morrendo por falta de ventiladores no Brasil. O caso mais visível é o de Manaus. Empresas brasileiras têm produtos bons, acessíveis, eficazes e com preço mais baixo que os importados, e que já passaram por todos os testes clínicos e técnicos. Estamos propondo a flexibilização e simplificação dos processos de cadastro da empresa como fornecedora de insumos de saúde”, afirma Chiodini.

A fabricação de respiradores vem sendo um dos maiores desafios no combate ao coronavírus. O aparelho é usado para ajudar pacientes que apresentem insuficiência respiratória, um dos sintomas mais comuns da Covid-19, doença causada pelo vírus, e esses equipamentos são essenciais para manter o aparelho respiratório funcionando enquanto o vírus é tratado.

Entenda o caso

A denúncia sobre a compra do governo do Estado de respiradores fantasmas por R$ 33 milhões junto à empresa Veigamed, do Rio de Janeiro, foi publicada por meio de reportagem do site The Intercept Brasil, na terça-feira (28).

Conforme a denúncia, o governo de Santa Catarina levou cinco horas para decidir comprar, receber uma proposta e confirmar a aquisição de 200 respiradores.

Os aparelhos, que deveriam ter sido entregues no início de abril, em 48 unidades de saúde do Estado, não chegaram.

Cada respirador custou R$ 165 mil – valor bem acima dos R$ 60 mil a R$ 100 mil pagos pela União e por outros Estados.

Na quarta-feira (29), o governador Carlos Moisés disse ter aberto uma sindicância e afastado a servidora responsável pela compra.

No mesmo dia, a Alesc abriu uma CPI para investigar a compra dos respiradores. Os deputados também pediram o afastamento do então secretário da Saúde Helton de Souza Zeferino.

Ministério Público de Santa Catarina e Ministério Público de Contas anunciaram que também vão investigar o processo de compra.

Ainda na quarta-feira (29), a Justiça determinou o bloqueio de R$ 33 milhões pagos pelo governo para a Veigamed.

Na quinta-feira (30), o empresário Rafael Wekerlin denunciou pedido de propina de R$ 3 milhões. Ele encaminhou orçamento ao governo para compra emergencial e disse que sua proposta foi copiada e usada pela Veigamed.

No final do dia, o então secretário de Estado da Saúde, Helton de Souza Zeferino, deixou o cargo. O pedido de exoneração foi aceito pelo governador Carlos Moisés.

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