Operação O2: Ação penal do MPSC é recebida em relação a empresários pelo Poder Judiciário

Foto: Divulgação

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14/09/2021 - 05h47

Dos 14 denunciados, sete já podem ser considerados réus em ação penal. Outros dois, por serem funcionários públicos denunciados pela suposta prática de crimes no exercício da função, têm direito à defesa prévia antes da avaliação do recebimento em relação a eles. Os cinco restantes passarão por audiência para avaliar se aceitam propostas de transação penal ou acordo de não persecução penal oferecida pelo Ministério Público.

A ação penal do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) contra empresários e agentes públicos por uma série de crimes praticados na venda de 200 respiradores pulmonares não entregues ao Estado de Santa Catarina foi recebida pela Justiça em relação a sete das 14 pessoas denunciadas. A ação penal foi cindida em relação aos outros sete acusados devido à necessidade de trâmites diferentes em relação a esses denunciados.

A denúncia do MPSC foi recebida pelo Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis em relação aos sete empresários, que vão responder por organização criminosa, estelionato, falsificação de documento particular, falsidade ideológica, uso de documento falso e lavagem de dinheiro. A decisão judicial aponta que a materialidade dos crimes apontados pelo Ministério Público e os indícios de autoria estão evidenciados nos elementos de prova contidos nos autos, incluindo indícios de autoria do crime de constituir e integrar organização criminosa.

Outros dois acusados - um ex-servidor denunciado por estelionato e obstrução da investigação e uma servidora denunciada por peculato culposo, uso de documento falso e obstrução da justiça - responderão em novos autos devido à necessidade de se facultar resposta prévia nos crimes praticados por funcionários públicos no exercício da função, no prazo de 15 dias, antes de o juiz deliberar sobre o recebimento ou não da denúncia.

A cisão processual foi decidida também em relação a cinco acusados: três servidores públicos denunciados por suposto peculato culposo, por terem sido supostamente negligentes; e dois particulares, um denunciado por estelionato e outro por falsidade ideológica. Como em relação a eles houve o oferecimento por parte do Ministério Público de propostas de transação penal ou de acordo de não persecução penal. Novo procedimento será autuado para a designação das audiências necessárias à aceitação ou recusa das propostas ministeriais.  Os acordos de transação penal e de não persecução penal são de oferecimento obrigatórios pelo Ministério Público quando os acusados preenchem os requisitos estabelecidos em lei. Para o primeiro, é exigido que o crime seja de menor potencial ofensivo, com pena máxima de dois anos e o acusado não pode ter condenação à pena privativa de liberdade por sentença definitiva em outra ação penal nem ter sido beneficiado por transação penal nos cinco anos anteriores. Já o acordo de não persecução penal exige a confissão do delito, que deve ter sido cometido sem violência ou grave ameaça e ter pena mínima inferior a quatro anos.

Ambos os acordos, se aceitos pelos acusados, suspendem o curso do processo até o prazo para cumprimento das obrigações estabelecidas. Se cumpridas corretamente, a ação é arquivada. Caso contrário, o processo volta à fase de análise do recebimento pelo Juízo competente.

Considerando o interesse público, também foi determinado pelo Juízo da Vara Criminal o levantamento do sigilo dos autos (sob o n. 5066291-47.2021.8.24.0023), como requerido pelo Ministério Público de Santa Catarina.

A Operação O2 foi deflagrada em maio do ano passado pela força-tarefa composta pelo MPSC, Polícia Civil e Tribunal de Contas (TCE). Dividida em duas fases, a operação colheu mais de 50 depoimentos e cumpriu 51 mandados de busca e apreensão e cinco de prisão preventiva.  

Um mês depois, em junho do ano passado, os autos da investigação foram remetidos para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que apurou os fatos durante um ano. O STJ devolveu a apuração para a força-tarefa catarinense em julho desse ano.

Organização criminosa  

De acordo com a ação penal, uma suposta organização criminosa teria sido constituída para que seus membros obtivessem vantagem patrimonial aproveitando-se da necessidade urgente de aquisição de equipamentos e materiais por entes públicos e privados para o enfrentamento da pandemia de coronavírus. A organização criminosa seria chefiada por um dos empresários, que contou com auxílio direto de um agente político.  

Os empresários ofereciam para a venda respiradores pulmonares que não existiam. Naquele momento esses equipamentos eram essenciais para o tratamento de casos graves de covid-19 e, por isso, extremamente escassos e com valores muito elevados na ocasião. A negociação envolvia a exigência de pagamento antecipado. Utilizando os mesmos métodos, o grupo também negociava com entes públicos e privados de outros estados.  

Especificamente no caso de Santa Catarina, a suposta organização criminosa teria tido como elo com o poder público um agente político, e contado com a atuação facilitadora de uma servidora pública.  

Além dos empresários que integravam a organização criminosa, outras pessoas participaram direta ou indiretamente da negociação e foram denunciadas de acordo com o papel que exerceram na fraude.  

As provas coletadas no curso da investigação, que por um ano foi conduzida pelo STJ, mostram que o procedimento administrativo de compra dos respiradores pulmonares (PSES 37070) foi instruído com duas propostas falsas, de modo a assegurar a contratação da empresa pertencendo à organização criminosa.  

A ação penal foi assinada pelos Promotores de Justiça que integram a força-tarefa O2 - as Promotoras de Justiça Isabela Ramos Philippi, Lara Peplau e Marina Modesto Rebelo e os Promotores de Justiça Maurício de Oliveira Medina e Alexandre Graziotin - e pelo Promotor de Justiça Thiago Carriço de Oliveira, que responde pela 26ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital.  

PRÓXIMOS PASSOS DO PROCESSO JUDICIAL  

Acusados com proposta de acordo

Serão marcadas audiências judiciais para que aceitem ou não a proposta do MPSC.

Caso aceitem o processo é suspenso até o cumprimento das obrigações ajustadas.

Caso não aceitem, o Juízo da Vara Criminal decidirá sobre o recebimento ou não da denúncia. 

Servidores públicos sem proposta de acordo

Terão 15 dias a partir da citação para apresentar defesa prévia antes do Juizo deliberar sobre o recebimento da ação.

Após recebimento da ação

Após o Juiz decidir pelo recebimento da ação penal, os envolvidos passam a ser réus. Inicia-se o processo e os réus são citados (chamados)  para se defender. Esse é o caso dos sete empresários acusados.  

Os envolvidos começam a rebater as acusações com justificativas embasadas em documentos e indicam testemunhas.  

O Juiz analisa tudo e pode absolver sumariamente (sem ouvir mais ninguém) os réus ou designar uma audiência de instrução e julgamento.  

Na audiência de instrução e julgamento são produzidas mais provas, as testemunhas são ouvidas e pode haver até "acareações" - os envolvidos ficam frente a frente para o confronto de versões.  

No final da audiência são oferecidas as chamadas alegações finais - tanto defesa quanto testemunhas se manifestam para demonstrar as suas versões do fato.  

Após as alegações finais, a ação penal está pronta para o Juiz anunciar a sentença.

Entenda a dinâmica da fraude dos respiradores em Santa Catarina:

De acordo com a ação penal, um grupo de empresários se aproveitou do momento mais crítico da pandemia e estruturou uma organização criminosa para obter vantagens. Esse grupo tentou vender respiradores que não tinham para o Hospital Albert Einstein, de São Paulo, para a empresa RTS Rio S/A, para a Prefeitura de Barueri/SC, para a Associação Cultural Floresta, de Porto Alegre, para o Estado do Amazonas e para a Secretaria de Estado de Saúde de Santa Catarina. Apenas a Secretaria de Saúde catarinense fez negócio com o grupo.  

22 de março de 2020:  

Em trocas de mensagens, um agente político indica integrantes da suposta organização criminosa como fornecedores que poderiam atender a demanda do Estado por respiradores. Nesse mesmo dia, uma servidora pública recebe o prospecto e uma foto de respiradores pulmonares.  

22 a 25 de março de 2020:  

Uma série de contatos entre a servidora e o empresário é estabelecida para um ajuste de venda de respiradores pulmonares ao Estado. Nessas ocasiões, o empresário afirma que dispunha de 500 respiradores para pronta entrega e destaca a urgência no fechamento do contrato, já que a demora resultaria na venda para outro interessado.  

25 de março de 2020:  

O empresário negocia com a servidora 200 respiradores pulmonares para pronta entrega, ao preço unitário de R$ 169 mil.   Um agente político intervém, obtém a redução do preço para R$ 165 mil e determina à servidora que feche a compra com o empresário.  Diante do acerto verbal, empresários elaboram uma proposta recorrendo a um empresário idôneo, que desconhecia o ajuste ilícito. Nessa noite, uma proposta é encaminhada à Secretária da Saúde.  

26 de março de 2020:  

Inicia-se processo de dispensa de licitação para a aquisição direta dos bens.   O empresário que não sabia que o negócio seria uma fraude foi contatado pela organização criminosa para que pagasse R$ 3 milhões em propina.

O empresário recusou-se a participar da ilegalidade e abandonou o negócio.  

Passam a agir, então, integrantes da empresa registrada no nome de um "laranja" e que vai vender os respiradores que não existem para o Estado.  

Nessa noite, uma proposta em nome dessa empresa, não assinada, é encaminhada pelo grupo de servidores.

27 de março de 2020:  

O empresário, líder da fraude, solicita a substituição da proposta enviada dois dias antes por outra proposta, não assinada, e passa a cobrar o depósito dos valores adiantados para a entrega dos equipamentos.  

Iniciada a dispensa de licitação, a Assessoria Jurídica da Superintendência de Gestão Administrativa lança um despacho no processo administrativo de compra indicando a necessidade de juntada de mais dois orçamentos de outros fornecedores, a fim de demonstrar a adequação do preço ao mercado.  

28 de março de 2020:  

A servidora faz contato com o empresário e solicita dois orçamentos.  O empresário contata seus parceiros e estes enviam orçamentos falsos à Secretaria de Estado da Saúde.

1º de abril de 2020: 

O Estado de Santa Catarina efetua o pagamento de R$ 33 milhões à Veigamed para o fornecimento de 200 respiradores pulmonares Medical C35, os quais jamais foram entregues.  

3 de abril de 2020:

O pagamento feito pelo governo efetivamente entra na conta bancária da empresa que até hoje não entregou os respiradores para o Estado.

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  • Jornal Regional



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