Entre negociações
para reduzir salário, busca por linhas de crédito oferecidas pela CBF e
renegociação de dívidas, os clubes brasileiros pouco a pouco já começam a se
precaver para um dos maiores impactos financeiros da história.
Segundo um estudo da consultoria Ernst & Young obtido pelo Estadão, a paralisação do calendário causada pela pandemia do novo coronavírus deve fazer com que os clubes nacionais tenham uma retração de quase R$ 2 bilhões em comparação a 2019 e voltem ao patamar financeiro similar ao encontrado há quatro anos.
A provável disputa de jogos com os portões fechados até o fim do ano é a maior responsável pelo grave impacto. O trabalho realizado pela empresa tenta medir o impacto financeiro no futebol brasileiro dentro de dois cenários.
No mais otimista, a
retração seria de R$ 1,34 bilhão enquanto que na pior estimativa, a cifra seria
de quase R$ 2 bilhões, mais precisamente R$ 1,92 bilhão.
Os responsáveis
pelo estudo ressaltam que toda uma cadeia de receitas ligadas ao futebol
sofrerá duros golpes. O fato de as partidas não terem público, deve impactar
não só na bilheteria, como também na diminuição de 40% do quadro dos
participantes nos programas de sócio torcedor.
Há também uma
previsão da queda de recursos até vindos do pay-per-view, pois há uma
estimativa de que a crise econômica leve até a 40% dos assinantes a cancelarem
os pacotes.
“Poucos clubes vão
ter condições financeiras de se apresentar de forma digna. Vários vão ter
problemas sérios. Na prática a pandemia não mudou nada, mas apenas acelerou
processos. Quem já estava mal, piorou mais rápido”, disse ao Estadão um dos
responsáveis pelo estudo, Alexandre Rangel.
“As transferências
de jogadores vão ter um desvalorização também. Alguns clubes como o
Athletico-PR e o Flamengo fizeram vendas na janela de janeiro e, por isso, se
deram bem. Quem apostou que venderia jogadores no meio do ano, ficou em
situação difícil”, avaliou.
Desde a parada do
calendário, em março, os clubes brasileiros começaram a se movimentar para
diminuírem os prejuízos. Das Séries A e B do Brasileiro, somente o Red Bull
Bragantino não fez reduções salariais nem demitiu funcionários. Muitos outros
clubes precisaram fazer reajustes e contar com o auxílio da criação da linha de
crédito de R$ 100 milhões criada pela CBF.
O panorama se torna
preocupante porque não há mesmo previsões do recebimento de grandes receitas
neste ano, principalmente as verbas oriundas de premiações. A CBF costuma
distribuir aos campeões da Copa do Brasil e o Campeonato Brasileiro mais de R$
100 milhões.
No entanto, como
essas competições devem se prolongar até o início de 2021, os clubes terão de
fechar a temporada sem esses recursos para bancar despesas pesadas, como o 13º
salário.
“Até vejo que para
alguns clubes, talvez seja melhor que o campeonato não retorne, porque pode ser
até mais prejudicial ainda ter de jogar para o estádio vazio e sem recursos”,
afirmou outro responsável pelo estudo, Pedro Daniel.
De acordo com um
levantamento da própria Ernst & Young, o futebol é responsável no Brasil
por 155 mil empregos. Muitos desses postos, aliás, se encontram ameaçados pelos
impactos da crise.
Possíveis soluções
Enquanto o futebol
não tem data para retornar, os dirigentes dos clubes têm discutido possíveis
alternativas para a crise e a solução mais palpável no cenário é o de acelerar
mudanças que já estavam em discussão.
Para especialistas
ouvidos pela reportagem, a transformação em clube-empresa, investimento em
ações de marketing e a possibilidade de renegociação de dívidas do Profut
(Programa de Refinanciamento Fiscal do Futebol Brasileiro) são alguns alentos.
Para o advogado
especializado em direito esportivo Vantuil Gonçalves Júnior, do escritório
Trengrouse e Gonçalves, em termos jurídicos os clubes vão precisar tomar
medidas radicais, até por estarem anteriormente com números muito ruins.
Uma das possíveis
opções é avaliar uma brecha até para se pedir recuperação judicial, já que
alguns projetos ligados à vida financeira do clube ainda estão em andamento na
Câmara, como é o caso do clube-empresa e da suspensão das parcelas do Profut.
“A pandemia
acelerou o processo de modernização dos clubes. Será preciso pedir algum tipo
de ajuda no Legislativo. A grande crise atual exige alguma medida drástica.
Vejo até como uma possível oportunidade para que se consiga fazer um acordo da
recuperação judicial com os credores”, explicou.
Um dos autores do
estudo da Ernst & Young, Gustavo Hazan, considera que é o momento para os
clubes brasileiros acelerarem mudanças. “A adoção do fair-play financeiro, da
profissionalização e o projeto do clube-empresa podem ser impulsos importantes
para dar mais segurança ao investimento eterno. Algo diferente precisará ser
feito”.
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