Brasil e Paraguai
anularam, nesta quinta-feira (1º), a ata sobre compra de energia da usina de
Itaipu assinada em maio por representantes dos dois países
que iniciou uma crise política no governo de Mario Abdo Benítez.
Em seguida, a bancada Honor Colorado, ligada ao ex-presidente Horacio
Cartes, que é da base de apoio do mandatário, mas estava alinhada à proposta de
fazer um julgamento político que poderia resultar em impeachment, declarou que
mudou de posição. O anúncio foi feito pelo presidente da Câmara dos Deputados
paraguaia, Pedro Alliana. Com isso, segundo a imprensa paraguaia, acaba a
chance de a oposição avançar com o processo de deposição.
O embaixador do Brasil no Paraguai, Carlos Alberto Simas Magalhães,
assinou em Assunção um documento em que o Estado brasileiro reconhece a decisão
do Estado paraguaio de anular a renegociação que faria o país vizinho pagar
mais caro pela energia da usina binacional.
O ministro das Relações Exteriores paraguaio, Antonio Rivas Palacios,
destacou que, desta forma, as negociações a respeito voltam à estaca zero.
'Erros'
Abdo discursou em Assunção logo após o cancelamento da ata e o anúncio
do grupo Honor Colorado de que não apoiaria o processo de impeachment. Ele
agradeceu aos parlamentares que o "salvaram".
"Disse que não vou
tolerar a corrupção, que não importa o quanto dia, por causa da proximidade de
meus colegas e amigos de luta, isso não nos dá o direito de ter má conduta na
administração de coisas públicas. Não só atos de corrupção, mas também erros. É
por isso que ordenei que aqueles que participaram do processo, talvez sem má
vontade, sejam removidos do cargo", disse o presidente.
Pedido de impeachment
Os partidos de oposição do Paraguai haviam anunciado nesta quarta (31)
que apresentariam um pedido de impeachment contra Abdo e o vice-presidente Hugo
Velázquez por conta do escândalo em torno da polêmica renegociação.
O acordo elevaria os custos para a empresa estatal de eletricidade do
Paraguai em mais de US$ 200 milhões, segundo o ex-diretor da entidade. O
documento, assinado sem divulgação à opinião pública pelos governos de Brasil e
Paraguai, foi revelado apenas na semana passada.
Resumo da crise
-em maio, os governos brasileiro e
paraguaio assinaram uma ata que, na prática, faria o Paraguai pagar mais caro
pela energia de Itaipu.
-pelo texto assinado, o Paraguai
aumenta a previsão de compra da chamada energia garantida, mais cara, reduzindo
o consumo da energia chamada de excedente, que é mais barata.
-a revelação da existência do acordo
levou o chanceler paraguaio, o presidente de Itaipu e outros dois funcionários
de alto escalão a renunciarem.
-a oposição paraguaia acusa o
presidente Mario Abdo de favorecer interesses brasileiros e passou a defender
um processo de impeachment na Câmara dos Deputados.
-a ata foi cancelada, Abdo fez um
discurso admitindo que houve erro e o setor da sua base que cogitava apoiar o
impeachment voltou a apoiá-lo.
O que diz a ata
A oposição paraguaia denuncia que o acordo firmado em maio poderia levar
a aumentos nos custos de energia para o país. O jornal paraguaio "ABC
Color" aponta que a usina de Itaipu fornece energia com dois preços
diferentes a Brasil e Paraguai: há a energia garantida (mais cara) e a energia
adicional, que é um excedente (mais barato).
Em 2007, em troca da instalação de mais duas turbinas binacionais, das
quais o Brasil precisava, o Paraguai conseguiu negociar o benefício para
comprar energia adicional em maior quantidade, pagando menos do que se
consumisse o mesmo volume na forma de energia garantida.
Com a nova ata, diz o "ABC Color", o Paraguai concordava em
usar a energia garantida de Itaipu -- mais cara que a excedente, que é usada
hoje pelo país em maior proporção --, renunciando assim ao benefício que representava
a compra dessa energia adicional, mais barata. O novo acordo geraria uma
diferença de US$ 350 milhões (R$ 1,3 bilhão) para a Administração Nacional de
Eletricidade (Ande) paraguaia, segundo especialistas da área ouvidos pelo
periódico.
Usina binacional
A hidroelétrica de Itaipu, construída sobre o rio Paraná, que separa o
Brasil e o Paraguai, produz 14 mil megawatts e é a segunda maior do mundo,
atrás da chinesa Três Gargantas. O Brasil consome 93% da energia da usina, e
compra o excedente da parte que caberia ao Paraguai.
A oposição paraguaia questiona a venda dessa energia "a um preço
ridículo", segundo afirmou o parlamentar Ricardo Canese, que pertence ao
partido Frente Guasú (Frente Grande).
Depois de 50 anos, em 2023, os dois países devem rever o tratado
original de Itaipu, assinado em 1973 por Alfredo Stroessner e Ernesto Geisel.
Um novo tratado envolve a revisão do preço da energia, que sempre foi
percebida no Paraguai como desfavorável aos seus interesses.
"O Paraguai deixou de receber US$ 75 bilhões por não vender a preço
de mercado, desde que a usina começou a operar em 1984", garantiu à AFP o
cientista político Miguel Carter, segundo cálculo feito a partir de dados
oficiais.
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