Ronaldinho Gaúcho e o irmão, Roberto Assis, sendo levados algemados para prisão Foto: NORBERTO DUARTE / AFP
“Não paro de pensar
no caso dos passaportes paraguaios de Ronaldinho e de seu irmão Assis. Conheci
Assis no começo da sua carreira. Eu era repórter esportivo e cobria o dia a dia
do Grêmio. Na primeira vez que vi Ronaldinho ele devia ter uns sete anos de
idade e espichava-se para tentar acertar uma bola numa mesa de sinuca. Essas
lembranças me levam a ter sempre certo carinho por esses irmãos talentosos que
saíram da pobreza para a riqueza graças ao futebol. Além disso, Dona Miguelina,
mãe de Ronaldinho e Assis, trabalhou na cozinha da escola da Cláudia, minha
mulher, durante muitos anos. Enfim.
Por que alguém que
está de posse do seu passaporte nacional usa um passaporte estrangeiro falso
para entrar num país no qual poderia ter ingressado com uma simples carteira de
identidade? Não li em lugar algum na mídia qualquer hipótese capaz de servir de
resposta razoável. Seria um treino para alguma urgência futura? Adultos
conscientes, em princípio, não apresentam documentos falsos a autoridades. O
mais perto que se chegou de uma explicação foi a de que os irmãos teriam pedido
para ser naturalizados paraguaios. Mas eles teriam negado. O que me chama a
atenção é a falta de questionamentos e reflexões na imprensa.
Confesso que fiquei
acabrunhado ao ver a foto dos irmãos algemados. Ronaldinho é um dos maiores
jogadores de futebol de todos os tempos. As imagens que guardo dele são quatro:
a da mesa de sinuca já citada, a do chapeuzinho no Dunga, num Gre-Nal, a do gol
contra a Venezuela, o seu primeiro pela Seleção, e a do famoso gol contra a
Inglaterra, aquele que suscita dúvidas: ele teria cruzado ou chutado a gol?
Lembro-me de ter encontrado Assis em Paris nos anos 1990. Perguntei-lhe pelo
pai. Com ar compungido, ele me respondeu em francês:
– Il est mort.
Apesar de todas as
polêmicas envolvendo os dois, guardei esses flagrantes do passado. Não fui
amigo deles. Quem sou eu para isso! Já falei aqui de outra lembrança: Assis
voltando da Itália, sendo carregado do aeroporto na carroceria torta de um
caminhão, um monte de gente entrando na casa humilde e parte dela cedendo. Eram
os tempos do chamado à aventura. Depois, veio a ascensão, a glória de
Ronaldinho e a mitologia. Tudo isso não casa com passaportes paraguaios falsos,
algemas, silêncios e transferências de responsabilidade. Que lance foi esse?
Que bola fora foi essa? Que gol contra. Que triste canelada.
A mídia parece
constrangida. O herói entra em decadência, afunda-se em processos judiciais,
patina. O povo que o admira só pergunta uma coisa: por que tudo isso, com tanto
dinheiro? Talvez, quando o leitor estiver terminando este texto, tudo já esteja
esclarecido. Não é disso que trato. Ocupo-me dos pensamentos que tenho tido
sobre o caso. Malandragem ou burrice? A consciência brutal retruca: crime.
Insiste: pode alguém apresentar voluntariamente um passaporte falso, não tendo
direito a esse documento, sem ter conhecimento da sua falsidade? Era tão mais
interessante só pensar nos gols e dribles de Ronaldinho.
No Paraguai ele
sofre por sua incompetência existencial, mas também é vítima de uma
espetacularização policial e judicial. Para que algemas?
Mais do que tudo,
Ronaldinho é prisioneiro da sua eterna imaturidade.”
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