O Planeta Terra bateu um novo recorde de emissão de gases de
efeito estufa na atmosfera em 2018. Segundo o relatório "Estado do Clima
2018", divulgado nesta segunda-feira (12) no Boletim da Sociedade
Americana de Meteorologia, a emissão de gases como dióxido de carbono, metano e
óxido nitroso seguiu aumentando e, combinados com outros gases conhecidos como
halogenados, já têm um efeito de aquecimento 43% maior do que em 1990.
Além disso, 2018 entrou para a lista de quatro anos
mais quentes desde pelo menos o fim do século 19, quando a medição começou a
ser feita. Os únicos três anos mais quentes que 2018 foram 2015, 2016 e 2017.
"Todos os anos desde o início do século 21 têm
sido mais quentes do que a média entre 1981 e 2010", diz o relatório.
Entre os especialistas, essa média, também chamada de "normal
climatológica" é uma taxa média anual a partir da qual as temperaturas
recentes são comparadas, para se ter uma medida de quanto as temperaturas têm
variado.
'Raio-x
do clima'
Essa é a 29ª edição do relatório "Estado do Clima",
que é publicado anualmente, sempre na metade do ano, e é elaborado pelos
centros de informação sobre o clima da Administração Nacional Oceânica e
Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês), com o apoio de centenas
de especialistas no assunto pelo mundo.
O cientista peruano Jose Antonio Marengo Orsini, que vive no Brasil há 25 anos
e hoje é coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de
Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), é um dos vários
coautores do estudo que se ocuparam do capítulo relativo às Américas do Sul e
Central.
Segundo ele, o relatório publicado nesta segunda
"é como um raio-x do clima em todo o mundo", que registra os eventos
particulares registrados durante cada ano. "É feito regularmente, em
outubro começamos a preparar o material para publicar no próximo ano",
afirmou ele em entrevista.
Além do Cemaden, as outras entidades brasileiras que
colaboraram com o relatório são o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e
o Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CCST) do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe).
O
que é o efeito estufa?
O efeito estufa é um fenômeno natural no qual a atmosfera da
Terra retém o calor que é irradiado pelo Sol e reflete na superfície, ou
emitido da Terra para o espaço. Porém, ele pode ser exacerbado pela ação
humana, com a emissão excessiva de gases, principalmente o dióxido de carbono.
Marengo, que é membro do Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da
Academia Mundial de Ciências, explica que uma das consequências naturais do
efeito estufa é o fato de a temperatura na Terra ser "agradável e
adequada" para as pessoas. "Se não fosse, as pessoas morreriam de
frio", diz ele, ressaltando, porém, que o problema começa quando a emissão
de gases passa a ser excessiva.
Para explicar o fenômeno, o
cientista dá como exemplo alguém que está com frio e coloca um casaco.
"Quando aumenta [a temperatura], é como se vocês colocasse seis, sete,
oito casacos. Você começa a sufocar", compara José Marengo,
coordenador-geral do Cemaden.
Segundo o estudo divulgado nesta segunda, "o dióxido de carbono é
responsável por cerca de 65% do forçamento radiativo".
A
temperatura no Brasil
A meteorologista brasileira Andrea Ramos, do Instituto
Nacional de Meteorologia (Inmet), é outra coautora do estudo. Ela disse que
a importância do estudo é poder reunir e analisar o comportamento das
temperaturas e chuvas em um determinado ano pelo mundo.
Andrea explicou que as informações sobre as chuvas e a
temperatura média registradas no ano são encaminhadas à OMM (Organização
Meteorológica Mundial) para, em conjunto com as informações de outros países,
"analisar o comportamento das temperaturas e chuvas e, assim, embasar por
meio dos registros como foi o ano correspondente, no caso, 2018, com os
demais".
Um resumo técnico publicado em maio e elaborado por
coautores do estudo corrobora as informações de que 2018 está entre os quatro
anos mais quentes já registrados.
"Desde 2012, a temperatura média ficou em torno
de 0,5°C acima da NC [a Normal Climatológica, equivalente à média de 1981 a
2010]", diz o documento.
Veja no gráfico abaixo qual foi a temperatura média de
cada ano no Brasil desde 1961, e como ela se compara com a média registrada
entre 1981 e 2010:
"Acredito que essa seja a
importância dessa coleta de informações, pois assim podemos identificar o
quanto foi frio ou quente, chuvoso ou menos chuvoso, com os anos
anteriores", disse Andrea Ramos, meteorologista do Inmet.
Destaques
da América do Sul
De acordo com Marengo, o capítulo do relatório dedicado à
região central da América do Sul, onde fica o Brasil, o Peru, o Paraguai e a
Bolívia, destacou alguns extremos de temperatura registrados no país.
No Sudeste brasileiro, por exemplo, a temperatura em
2018 foi 1º Celsius mais alta do que a média. Em abril e maio, o Sul do Brasil,
assim como a Bolívia e o Paraguai, registraram temperatudas entre 2ºC e 4ºC
acima da média, enquanto em julho e setembro a região tropical brasileira, a
Leste dos Andes, também teve temperaturas mais altas do que o esperado.
"No inverno (junho a agosto), vários episódios de
frio afetaram o Sul do Brasil, até o Oeste da Amazônia", continuou o
relatório.
Marengo explica que o aquecimento global não é sinônimo
apenas de temperaturas mais altas, mas sim de extremos mais intensos.
"Ainda que aparece na média um inverno mais
quente que o normal, também acontecem períodos muito frios. No Brasil, em maio
[deste ano] tivemos dias muito frios, e o inverno não terminou e já estamos com
30 graus de novo. Isso é uma mostra de que os extremos estão se tornando mais
extremos", disse ele.
O especialista destaca que, em 2018, o Nordeste teve chuva menor que o normal,
assim como sudoeste da Amazônia e algumas regiões costeiras do Peru. "No
caso do Paraguai, Bolívia, muitas chuvas intensas têm trazido enchentes e
deslizamento de terra que mataram pessoas", ressalta ele.
Outros destaques do relatório
O nível dos oceanos subiu pelo sétimo ano
consecutivo, atingiu a maior média global anual em 26 anos, chegando a 81
milímetros acima do nível médio de 1993;
A temperatura no Ártico em
2018 foi 1,2º Celsius acima da média entre 1981 e 2010 e, em junho de 2018, o
território ártico coberto por gelo já tinha encolhido para a metade do que era
há 35 anos;
Algumas regiões do mundo bateram recordes históricos de
temperaturas altas, como o Paquistão, com
50,2º Celsius em abril de 2018;
Nos países próximos da Linha do
Equador, o número de tempestades tropicais foi de 95,
acima da média registrada entre 1981 e 2010, de 82 tempestades anuais;
A intensidade deles também foi mais alta: um exemplo é o furacão Michael,
de outubro de 2018, o quarto mais forte a atingir o continente norte-americano em 168 anos;
Também nos Estados Unidos, os
incêndios florestais foram mais devastadores em 2018 e destruíram 3,5 milhões
de hectares, mais que a média de 2,7 milhões da primeira década deste século;
Por outro lado, na Groenlândia, as
temperaturas locais no verão foram um pouco mais baixas do que a média, e um
satélite que analisou 47 geleiras indicou que elas aumentaram de área pela
primeira vez desde 1999.
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