Imagem: FÁTIMA MEIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
O terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) completou dez dias na terça-feira (10) colecionando uma série de atritos
entre assessores próximos, nomeação de
ministros questionada até entre os apoiadores do petista, quedas de
braço entre as áreas política e econômica e crise na área
de segurança depois dos atos de vandalismo registrados em Brasília no último
domingo (8).
Depois da depredação nas sedes dos Poderes, em Brasília, Lula gerou mal-estar com a cúpula do Governo do Distrito Federal ao intervir na administração da capital federal. Em resposta às ações dos extremistas, o presidente nomeou um interventor federal para gerir a segurança pública do DF até 31 de janeiro. Atestado de que, para Lula, a gestão de Ibaneis Rocha (MDB), governador da capital do país, falhou.
Na mesma noite, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), afastou Ibaneis do comando do Governo do DF por 90 dias.
A oposição ao governo federal questiona a postura dos
ministros da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, e da Defesa, José Múcio
Monteiro, quanto as invasões às sedes dos Três Poderes.
Horas antes dos estragos, no próprio domingo (8), Dino afirmou que estava em contato com governadores, inclusive da oposição a Lula. "Espero que não ocorram atos violentos e que a polícia não precise atuar", afirmou na ocasião.
A Força Nacional estava autorizada — pelo próprio Dino — a atuar na Esplanada dos Ministérios desde sábado (7), quando o ministro garantiu a "atuação constitucional do Governo do Distrito Federal".
Não houve, entretanto, manifestações dos ministros quanto a ações da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) ou das Forças Armadas — incluindo o Batalhão da Guarda Presidencial, subordinado ao Exército, que deveria zelar pelo Palácio do Planalto.
Bate-cabeça
A reação dos eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à
vitória de Lula nas urnas chegou a ser chamada de "legítima" pelo ministro da Defesa, José
Múcio Monteiro. A fala, que classificou ainda os atos nas portas
de instalações militares de democráticos, havia gerado mal-estar
entre os aliados do petista mesmo antes do vandalismo do
último domingo (8). Após os atos extremistas, a situação piorou.
Na semana passada, o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, foi
contrariado publicamente por Rui Costa, ministro-chefe da
Casa Civil. Lupi, durante a cerimônia de posse no cargo, afirmou que a última
reforma da Previdência, aprovada em 2019, seria revista em conjunto com
sindicatos. Após repercussão negativa do mercado, Costa negou a informação e
disse que não há nenhuma proposta do tipo em análise, no momento.
Mercado
Ao fim da primeira semana do terceiro governo de Lula, a Petrobras perdeu ao
menos R$ 12,6 bilhões em valor de mercado. A queda está
intimamente ligada à determinação de que ministros revejam e interromam
processos de privatização de empresas públicas.
Também pesou contra as ações da estatal na semana passada a indicação do senador
Jean Paul Prates (PT-RN) para comandar a companhia. O
descontentamento do mercado com a escolha envolve a posição contrária do
parlamentar à atual política de preço da Petrobras.
Contradições
Dino e Rui Costa colecionam momentos contraditórios. Em 21 de
dezembro, o ministro da Justiça e Segurança Pública anunciou o delegado Edmar
Camata para a chefia da Polícia Rodoviária Federal (PRF). No mesmo dia, no
entanto, Dino voltou atrás na
indicação, após a má repercussão entre aliados por causa de
apoio declarado pelo delegado à Operação Lava Jato.
Dois dias depois, houve a veiculação de uma possível
suspensão de um benefício criado por Bolsonaro, a modalidade do saque-aniversário do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT), disse que ia
propor a Lula o fim da medida, que, na avaliação de Marinho, reduz a reserva de
dinheiro que poderia ser acessada em caso de demissão. A situação, no entanto,
repercutiu mal entre o grupo petista por não ter sido negociada anteriormente.
Rui Costa sugeriu que dívidas de empresas condenadas no âmbito da Lava Jato sejam pagas por meio de investimentos em obras públicas. Para repactuar os acordos de leniência, o governo conversa sobre o assunto com o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU). No entanto, especialistas ouvidos pelo R7 alertam para a regulamentação e fiscalização da medida, porque a ação requer controle rigoroso para impedir novos atos de corrupção por agentes públicos e privados.
A invasão dos prédios do Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e Palácio do Planalto por extremistas neste domingo (8) em Brasília deixou um rastro de destruição no patrimônio público e em obras de artes. Uma delas foi o quadro As Mulatas, de Di Cavalcanti, que foi rasgado em seis lugares.
Na esteira de anúncios controversos, Rui Costa afirmou que não causa desconforto a proximidade da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, com ex-PM preso por atuar como chefe de milícia no Rio de Janeiro e condenado por homicídio e associação criminosa. Mas a denúncia foi recebida com preocupação entre os aliados do presidente Lula pelo desgaste na imagem do governo federal.
Além da titular do Turismo, outra ministra de Lula é alvo de
críticas. Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos foi
condenada, em 2019, pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), por
improbidade administrativa na contratação de gerenciamento da iluminação
pública de Olinda (PE) quando era prefeita do município. Na época, a defesa
dela disse que não houve prejuízo ao patrimônio público municipal e que a
sentença da Justiça reconheceu que Luciana não recebeu nem desviou dinheiro
público.
Aliança com opositores
Ao menos quatro ministros de Lula foram favoráveis ao
impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. À época, André de
Paula, agora titular da Pesca e Aquicultura, e Juscelino Filho, chefe da pasta
das Comunicações, eram deputadoes federais e votaram a favor do impedimento da
petista.
Simone Tebet, atual ministra do Planejamento e Orçamento, era
senadora e também concordou com a deposição de Dilma. Carlos Fávaro, titular da
Agricultura e Pecuária, era vice-governador de Mato Grosso à época da votação
do impeachment, mas participou de manifestações populares pelo impedimento de
Dilma, inclusive com postagens nas redes sociais.
Os três parlamentares que, à época, foram favoráveis à
deposição de Dilma também votaram pela instauração do teto de gastos,
modificado por Lula ainda na fase de transição por meio da PEC (proposta de
emenda à Constituição) do estouro.
Em 2016, em reação ao impeachment, aliados de Dilma e de Lula
chamaram de "golpe" o processo que institutiu Michel Temer (MDB) como
presidente.
Na mesma linha, os apoiadores dos petistas, inclusive de
movimentos sociais, classificaram a medida que limitava os gastos públicos de
"PEC do fim do mundo" e "da morte".
Emendas de relator
Apesar das críticas ao orçamento secreto, pela falta de
transparência e regras claras, Lula nomeou ministros que se
beneficiaram de verbas do dispositivo em 2022. Ao menos seis
indicados utilizaram R$ 221 milhões das RP9, como são chamadas as emendas de
relator.
São eles: Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ), Turismo;
Juscelino Filho (União Brasil-MA), Comunicações; André de Paula (PSD-PE), Pesca
e Aquicultura; Alexandre Silveira (PSD-MG), Minas e Energia; Carlos Fávaro
(PSD-MT), Agricultura e Pecuária; e Waldez Góes (PDT-AP, em migração para o
União Brasil), Integração e Desenvolvimento Regional.
Em 19 de dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal
(STF) declarou o orçamento secreto inconstitucional.
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